E aí, como foi o feriado?
O primeiro dia depois do feriado é sempre, no mínimo, curioso. O sujeito chega ao trabalho e de cara ouve a pergunte culminante: “E aí, como foi o feriadão?”. Será que as pessoas não percebem que esse tipo de pergunta é evasiva? E se o feriado foi um desastre? Tenho que compartilhar tudo que me aconteceu? E se foi bom, sou obrigado a falar de todas as minhas emoções? A questão aqui não é ser mal educado ao ponto de não responder a uma singela pergunta do colega, mas a de ter liberdade de guardar para si os acontecimentos do seu final de semana. Quando este tipo de pergunta lhe atinge, querendo ou não, você se sente na obrigação de redargüir. Se optar em falar um simples “não lhe interessa”, será taxado de grosso.
Possível diálogo fútil 1:
- Oi, Roberto!
- Oi, Carla.
- Ai, nem te conto, meu feriadão foi muito bom! Tenho várias novidades! Sabe o teu amigo... Aquele...
- O Beto?
- Isso, o Betinho...
- Aí, achei ele um gato, sabe. Encontrei com ele sábado lá no clube...
- E daí?
- E daí que ele pediu meu telefone, e marcamos de sair no próximo final de semana!
- Que interessante...
- O que é interessante?
- Essa tua felicidade por causa do Beto.
- Vocês brigaram?
- Claro que não, ele é meu melhor amigo.
- Você ta estranho, como foi teu feriadão?
- Não lhe interessa.
- Ui! Grosso! Deita e acorda de novo, bicho do mato!
Nesta situação, Roberto ficou de antipático, só porque ele não quis comentar sobre seu feriadão. Mas onde está escrito que ele deve contar sobre seus acontecimentos de final de semana? O “não lhe interessa” é um direito que possui. Não poderia ser chamado de grosso ou “bicho do mato”, no entanto, isso ocorre corriqueiramente.
Por outro lado, há aqueles que são mais pacientes e acabam respondendo de forma resumida.
Possível diálogo fútil 2:
- Bom dia, Renata!
- Olá, Afonso!
- Tudo bem?
- Tudo. E com você?
- Tudo ótimo, meu feriado bombou!
- Ah, que bom...
- E o teu como foi?
(uma breve pausa)
- Ah... Sem grandes emoções... Foi normal.
(teu colega pode ser daqueles chatos que insistem, neste caso, o diálogo vai mais além).
- E esse normal é bom?
- Ai, normal é normal. Nem bom nem ruim.
- Ah, mas não tem nenhuma novidade mesmo?
(Agora a paciência está chegando ao fim)
- Não.
- Você não parece ser uma mulher de poucas novidades, tenho certeza que andou beijando neste findi. (O cara é realmente chato e quer dar uma de ‘amiga’, ou galanteador).
(o fim da paciência)
- Ai, Afonso! Não começa! Se eu tivesse alguma novidade eu te contaria, ok?
- Tudo bem.
Aqui, Renata possivelmente passará a imagem da mulher na TPM, ou a mulher sem sexo. Quando, na verdade, ela pode fazer sexo três vezes por semana e ter saído da TPM há 72 horas. Todavia, ela tem a livre escolha de não expor nada sobre seu feriadão. Por que isso é tão difícil de entender?
O terceiro e último possível diálogo, seria aquele em que ambos acabam conversando sobre o que fizeram no feriadão. Na prática, sabemos que isso não é uma verdade completa, embora seja comum ocorrer. Não se sabe ao certo se os dois possíveis interlocutores estão com vontade de contar suas novidades, eles podem as compartilhar por inúmeras hipóteses: precisam de um conselho; querem desabafar com o primeiro ser que encontrarem; desejam demonstrar uma falsa simpatia ao perguntar algo que não necessita ser perguntado, ou responder algo que não custa rebater ao infeliz que perguntou.
Por mais que este assunto lhe soe estranho ou fora de questão, ele é real. Hoje, ao chegar a sua escola, a sua faculdade ou ao seu emprego, com certeza irão lhe perguntar sobre o feriadão. Se isso incidir, peça, gentilmente, que o perguntador acesse este blog e leia este texto. (Juro que não é uma jogada de marketing).
As pessoas têm que entender que há dias em que você não quer falar sobre seus acontecimentos. Porém, há também os dias em que você não quer parar de recitá-los verbalmente. O que deve ser exercitado é o bom senso, o olho crítico e observador. Antes de perguntar alguma coisa a alguém, preste atenção na situação, no lugar e no momento, só depois pergunte. Você não pode adivinhar que tal fulano não quer falar, mas pode tentar entender o porquê do fulano estar quieto. E para isso, não necessitamos indagar. Devemos apenas ser mais cautelosos, não só com os outros, mas com nós mesmos.
O mais perpetuante ou hipócrita disso tudo, é que eu sou uma das pessoas que pergunto sobre as novidades do feriadão. Também pertenço àquele grupo que contam suas novidades aos curiosos que perguntam. O que farei hoje? Acho que terei que apelar para a dor de garganta.