MEU VELHO PAI
Meu pai sabia tocar violão muito bem e gostava de entoar as velhas canções do seu tempo. Muitas vezes, à noite, depois do frugal jantar, sentava no sofá, afinava cuidadosamente o instrumento e, com a mão esquerda, tocava sucessos que embalavam nossa infância. Mamãe sentava ao seu lado e, embora cansada da labuta diária, olhava-o sonhadora, sorrindo ou discretamente permitindo o cair de algumas lágrimas mais afoitas faces abaixo, ouvindo seu amado deixar-se conduzir pela magia das melodias só conhecidas por eles dois. Aliás, foram esse seu traquejo musical e o seu jeito seresteiro os pontos mais evidentes que contribuíram para ele conquistar o coração e o completo amor de minha mãe. Mesmo estando noiva de um engenheiro rico que estava em Mossoró para construir a ponte Jerônimo Rosado, a primeira da cidade, que ligaria o centro ao bairro conhecido como Alto de São Manoel, mamãe alterou todos os seus planos por causa de um inesperado e repentino amor em explosão por aquele jovem magro e mal vestido, simples e humilde que dedilhava o violão com a mão esquerda, não era formado nem tinha emprego e vinha de família de parcos recursos. Preteriu o engenheiro e sua riqueza por ele, com quem casou, preferindo a felicidade do coração à aparência do luxo desprovida de sentimento. E mesmo vivendo com as dificuldades advindas e as adversidades cotidianas viveram mais de cinquenta anos de um casamento feliz e cinco filhos, dos quais eu sou o terceiro. Vivendo uma época do século passado, cujos pensamentos não acompanharam a evolução que trouxe mudanças paulatinas, como sói ocorrer de uma geração para outra, de certa feita aconteceu algo interessante para os padrões atuais. Eu estava todo feliz, aos dezesseis anos, com a alegria da primeira namorada e andava com a foto dela no meu bolso para exibir aos amigos, porque assim fazíamos tempos atrás. Então, uma noite, esbanjando sorrisos, aproximei-me do meu pai, puxei a foto da namorada do bolso e disse: "olha, papai, a foto de minha namorada." Ele me olhou bem sério, desafivelou o cinturão da calça e, brandindo-o bem no meu rosto, disse: "Sua namorada é isso aqui, ó!" Era o jeito dele e o que mandavam os ditames da época, tão e tão diferentes de hoje. Eu, quando meu filho mais novo arranjou sua primeira namorada, fiquei todo prosa e cheio de vaidade.
Meu pai sabia tocar violão muito bem e gostava de entoar as velhas canções do seu tempo. Muitas vezes, à noite, depois do frugal jantar, sentava no sofá, afinava cuidadosamente o instrumento e, com a mão esquerda, tocava sucessos que embalavam nossa infância. Mamãe sentava ao seu lado e, embora cansada da labuta diária, olhava-o sonhadora, sorrindo ou discretamente permitindo o cair de algumas lágrimas mais afoitas faces abaixo, ouvindo seu amado deixar-se conduzir pela magia das melodias só conhecidas por eles dois. Aliás, foram esse seu traquejo musical e o seu jeito seresteiro os pontos mais evidentes que contribuíram para ele conquistar o coração e o completo amor de minha mãe. Mesmo estando noiva de um engenheiro rico que estava em Mossoró para construir a ponte Jerônimo Rosado, a primeira da cidade, que ligaria o centro ao bairro conhecido como Alto de São Manoel, mamãe alterou todos os seus planos por causa de um inesperado e repentino amor em explosão por aquele jovem magro e mal vestido, simples e humilde que dedilhava o violão com a mão esquerda, não era formado nem tinha emprego e vinha de família de parcos recursos. Preteriu o engenheiro e sua riqueza por ele, com quem casou, preferindo a felicidade do coração à aparência do luxo desprovida de sentimento. E mesmo vivendo com as dificuldades advindas e as adversidades cotidianas viveram mais de cinquenta anos de um casamento feliz e cinco filhos, dos quais eu sou o terceiro. Vivendo uma época do século passado, cujos pensamentos não acompanharam a evolução que trouxe mudanças paulatinas, como sói ocorrer de uma geração para outra, de certa feita aconteceu algo interessante para os padrões atuais. Eu estava todo feliz, aos dezesseis anos, com a alegria da primeira namorada e andava com a foto dela no meu bolso para exibir aos amigos, porque assim fazíamos tempos atrás. Então, uma noite, esbanjando sorrisos, aproximei-me do meu pai, puxei a foto da namorada do bolso e disse: "olha, papai, a foto de minha namorada." Ele me olhou bem sério, desafivelou o cinturão da calça e, brandindo-o bem no meu rosto, disse: "Sua namorada é isso aqui, ó!" Era o jeito dele e o que mandavam os ditames da época, tão e tão diferentes de hoje. Eu, quando meu filho mais novo arranjou sua primeira namorada, fiquei todo prosa e cheio de vaidade.