A fome não tem seleção!
A rua estava tão vazia quanto o estomago dele. De igual maneira as campainhas escolhidas para tocar não faziam abrir as portas das luxuosas mansões até então hospitaleiras, tudo cheirava a velório. O silêncio já cansava aos ouvidos daquele pobre homem que apenas desejava o barulho do garfo tocando em um prato sortido de alimentos. Não precisaria ser de iguarias, mas uma mistura que lhe preenchesse o vazio da barriga, pois sua cabeça estava suficientemente de porquês. O que de pecado fizera aquele homem para naquele dia aquela privação e provação?
De repente um grito quebra todo silêncio, dezenas vozes em conjunto gritavam gooool, abafando uma única que pouco conseguia dizer foooome! Saciada o apetite de gols da seleção no primeiro tempo, um intervalo fez aparecer aos portões alguns curiosos que procuravam saber quem era e o que queria quem, inconvenientemente, os teria perturbado na hora de importantes passes que cada expectador não gostaria de perder. Volte daqui a quarenta e cinco minutos, recomendavam ao homem que há horas vinha driblando a fome, sem que alguém achasse nisto algo espetacular.
Finalmente as portas se abrem, a rua começa sua rotineira movimentação, mas o silêncio continua igual. A seleção perdeu o jogo, não houve comemorações! Foram recolhidas as garrafas de cervejas já vazias, as azeitonas não degustadas voltaram aos potes. Enfim, não havia nada mais a comemorar. Nem uma boa ação! E o homem tocava de porta a porta sem perder a esperança de que Juiz o enxergava a cada intervalo dado pelo juiz! E agradecia: “Obrigado meu Deus por me alongar a fome para que eu sinta melhor o sabor do alimento!”
Faz-me lembrar o paciente que após esperar em jejum quase vinte duas horas para ser submetido a uma cirurgia, é mandando de volta a enfermaria uma vez que não foi aberta vaga na UTI do hospital. Ainda no corredor e na maca, vendo a moça que entregava o mingau que os pacientes normalmente os acham horrorosos, mas pediu um daqueles. E achou o melhor alimento do mundo! E quase desmaiando lá ia o de barriga vazia descendo a ladeira daquela rua, e faz a última tentativa. A porta se abre um sorridente gringo o convida a entrar e lhe oferece um banquete, que até então deliciava sozinho: “Oh! Fiz torcida, eu sozinho, pelo time estrangeiro”, Nunca havia se alimentado tão bem e com comida tão gostosa! Foi ai que aquele homem entendeu o porquê do ditado; “há males que vêm para o bem”!