A Paquera
A PAQUERA
Aconteceu num daqueles barzinhos do chamado “Trinângulo das Bermudas”, também conhecido como “Bobódromo”, lá na Praia do Canto. Sentou-se com a esposa e pediu um chopp, um guaraná, uma porção de aipim com torresmo e um caldinho de feijão. Lá pelo oitavo chopp e segundo guaraná, após já ter jogado muita conversa fora, observou, numa mesa relativamente próxima e, por via de conseqüência, relativamente afastada, um belo par de coxas que ajudava a moldar um belíssimo par de pernas, parte integrante de um escultural corpo feminino pertencente a uma proprietária que, a julgar por aquelas sensuais piscadelas que emitia em sua direção, estava interessadíssima em “conhecê-lo melhor”. Talvez fosse só porque ele estava acompanhado. Elas adoram flertar com homens acompanhados! Algo semelhante ao prazer de provocar um doberman quando ele está bem presinho atrás duma grade. Mas, de repente, não era nada disso; ela podia estar sendo sincera, e ele só tinha uma maneira de descobrir isso. Para tanto, levou a mulher para casa e disse que ia ao cinema ver aquele filme que ela já tinha visto. Ela não gostou; afinal, havia insistido à beça na noite anterior para que ele fosse com ela e acabou indo sozinha. Ele alegara que não gostava de filme romântico. Se era assim, de onde surgira, agora, aquele súbito interesse por um romance? Resultado: saiu de casa brigado com a esposa! Detestava brigar com ela mas, como já dissera sabiamente Maquiavel: “Os fins justificam os meios”; e, naquele caso, o fim era muitíssimo nobre. E, além de nobre, esguio, esbelto, sensual, sexy ...: uma tentação!
Voltou ao bar torcendo para que cada milímetro daquilo tudo ainda estivesse ocupando aquele mesmo lugar no espaço (e vai ter competência para ocupar lugar no espaço assim lá em casa)! Por sorte ela ainda estava lá, e ainda solitária! Sentou-se na mesma mesa e ficou esperando o tira-teima. E, para seu deleite, o tira-teima foi-lhe favorável; mesmo desacompanhado foi destinatário de nova piscadela. Mais que depressa (não dispunha de muito tempo) fez sinal para que ela se aproximasse e foi logo dizendo:
- Pô gata, você já tava me deixando louco piscando esses faroizinhos azuis!
- Aí, cara, primeiro que faroizinhos azuis é, poeticamente, uma lástima; e segundo, eu não estava piscando pra você. Ë que eu tenho um “tic nervoso” desde criança, e já tô até acostumada com situações desse tipo. Mas, graças a Deus, esse papo de “farolzinho azul” é a primeira, e espero, última vez.
O sujeito ficou transtornado; de nada lhe valera o princípio maquiavélico! Brigara com a esposa em vão! Que decepção! Pensara que a batalha estava ganha e descobrira, agora, que a guerra nem havia sido declarada! Naquele momento, só uma coisa o consolaria: era poder ter o prazer de, ao menos, tocá-la. Nem que fosse um pequeno toque para sentir o calor do seu corpo. Um único toque! .... Toque? ... Tic, toque ... Tic-toc, tic-toc, tic-toc , tic-toc .......
- Êpa, me solta, me larga! Quê isso? Pááááára! !! Socorro!!!
- Desculpe-me. É que eu tenho um “toc nervoso” !