Marquesita

A jovem mãe de cabelos negros, descendente de japoneses, atravessava a rua para ir até o ponto de ônibus. A criança em seu colo, de 7 meses, também com os mesmos traços genéticos da genitora, balbuciava alto segurando um sapatinho, como se falasse com o objeto, e com a graça dos bebês, arrancava sorrisos por onde passava.

Logo que a mãe pisou na calçada, Dona Marquesita, chegou perto e começou a brincar com a criança que sorria de volta aos agrados. "Estudiosos, gente que sabe o que está falando, dizem que as crianças de hoje são espíritos muito evoluídos e vieram ao mundo para salvar nosso planeta!" A mãe, de maneira educada, respondia por monossílabas àquela velha senhora. Algo na idosa não lhe agradava, talvez a sensação de uma leve demência, por isso sentiu-se aliviada quando seu ônibus chegou e foi embora.

Dona Marquesita, ficando só, puxou papo com outra pessoa que esperava a condução. A moça, que foi a escolhida agora, gentilmente, dava atenção e fazia comentários que eram respondidos de forma enfática. Dona Marquesita fazia questão de dizer que o filho mais velho era piloto do Banco Bradesco "Não quer se aposentar", acrescenta. A outra filha é procuradora do INSS e a outra trabalhava em um instituição estadual. "Já estão todos bem". A moça pergunta sua idade. Setenta e oito. Responde séria esperando um comentário. A jovem, que tem a mãe um pouco mais nova, elogia a aparência da senhora comparando com a própria mãe, que estava muito debilitada fisicamente.

"Ah, obrigada", respondeu Dona Marquesita.

"Que ônibus a senhora vai pegar?", perguntou a jovem ao constatar que vários passavam e ela nem mesmo se preocupava em saber qual era.

"Nenhum, eu venho aqui só pra me distrair, moro a dois quarteirões daqui". A jovem olhou com mais atenção para Dona Marquesita, perguntou seu nome e ouviu: "Tenho esse nome porque minha avó, mãe de minha mãe, também se chamava assim. Meu pai, querendo puxar o saco da sogra, deu para o a filha o mesmo nome". Estava bem vestida, e com uma bolsa a tiracolo como se fosse sair para algum lugar. Ela ficava assim exatamente para ficar no ponto e ninguém desconfiasse que estava ali só para procurar pessoas e conversar. Mesmo dizendo, contraditoriamente, que estava ali para isso. "A senhora mora sozinha?"

" Sim, meu marido morreu e meus filhos têm a vida deles".

A condução da jovem chegou, ela se despediu com beijo no rosto da senhora e esta ficou lá, procurando outra pessoa para conversar e matar sua solidão.