COTIDIANO

Saíram os dois de seus lares,

ele de manhã em direção a mais um dia de trabalho

e ela apenas pra mais um passeio na vida.

Numa cidade grande milhões de pessoas saem com os mesmos propósitos todo dia !

Ele,

gerente de banco, estressado e dilapidado pela rotina...

ela, mãe, esposa e ...vazia.

Em seu carro de luxo ela sonhava com príncipes ou gogo boys .

Ele em seu usadinho mas imponente, preso no velho e enjoativo trafego da manhã, imaginava como seria ter nas mãos alguém que pudesse dar-lhe o prazer perdido.

Ela queria mais da vida. Sempre quis !

curiosamente foram para o mesmo lugar no mundo. Um shopping center.

Ele abriu sua agencia como fazia há a 10 anos

e ela queria apenas mais uma lingerie pra sua coleção. Uma maneira de se fazer notar .

Mas naquele dia cruzaram-se disputando a mesma vaga de garagem...

Ele,

já esquecera o cavalheirismo da juventude. Criou-se no mundo competindo e competindo...

Ela,

acostumada a ter tudo nem pensou que poderia ter chego depois .

Brigaram...discutiram e o pior, nem sequer usaram a vaga.

Ele,

imaginou que o dia seria difícil, sabia que quando começava assim nunca terminava bem.

Ela sentiu o de sempre,

que o mundo fora da sua redoma era desprezível.

Ele trabalhou, estafantemente..

Enquanto ela, comprou absurdamente...

O céu enegrecia o fim de tarde e uma torrencial chuva anunciava a chegada da noite.

Ela assustada saiu depressa, queria chegar em casa antes do marido pra provar sua peça intima.

Não havia comprado pra ele. Não !

sentia-se bem e valorizada com roupas assim...

ele,

sem pressa e sem destino certo apenas pegou seu carro e pensou num bar pra se abrigar da chuva que chegava .

No caminho um carro parado no acostamento chamou-lhe a atenção.

Era ela.

A mesma madame da manhã. Pensou em passar direto mas resolver sem razão aparente parar para ajudar.

Ela reconheceu de cara o homem que se aproximava e pensou

“nem gogo boy e nem príncipes ”apenas mais um pobretão !

Por sorte só um pneu furado, ele pensou. Troco e me mando.

Mas não contavam com a chuva.

Bendita chuva que pode lavar almas...

Não havia abrigo e de súbito correram para o mesmo carro velho,

ele por ser dono e ela por puro instinto.

Molhados e sem saber como agir trocaram poucas palavras:

- esse carro não tem ar condicionado ? ela disse.

- não minha senhora, não tem .

- hum...- não precisa me chamar de senhora. Pode me chamar de Si.

- Si ? só isso ?

- sim, só isso.

- pode me chamar de Lu...

A mulher riu.

Rindo olharam-se e perceberam que o mundo deles havia ficado do lado de fora.

De repente ele se sentiu um cafajeste por pensar em ter aquela dama.

Imaginou que talvez uma dama fosse mesmo uma puta na cama.

Ela sentiu que nem todos os príncipes matam um dragão pra salvar sua amada...alguns podem apenas trocar um pneu.

Um beijo mudo selou a fantasia de ambos.

Não existia camas nem castelos, somente um carro velho que balançava frenético, aplacando a sede de dois corpos.

Ela não precisou esperar seu espelho dizer o quanto ficava gostosa em sua nova lingerie.

Experimentou ali mesmo para aquele homem estranho e sem charme, que a afogava em prazer.

Ele não fugiu da suas fantasias naquele dia e colocou em pratica tudo que julgava incapaz de fazer.

Foram felizes enquanto a chuva caiu.

Mas como nem tudo que reluz é ouro,

a chuva parou e trouxe atrás dela a verdade dos dois.

Ele foi embora com as mãos sujas de graxa

e ela voltou pra seu espelho.

Nunca mais se viram.

Mas descobriram juntos que o cotidiano não existe.

Somos nós mesmos que o criamos !

luis lopes
Enviado por luis lopes em 29/03/2008
Código do texto: T922065
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