O circo armado
O velho palhaço tira a maquiagem, em gestos lentos e mecânicos. Diante do espelho vislumbra as marcas de anos na estrada. Lá fora, na platéia, ria com ele, ou ria dele? Como uma assembléia legislativa a rir do povo alegremente ingênuo.
Agora ele ria da platéia. Não, não ria. Chorava. Ele também, sem mascara, era platéia, aturdido pelos achaques pitorescos a sua casa, sua cidade, seu país, enquanto riam.
Sois seu dia. Piruetas e mais piruetas. Lembrava que neste dia nascera Piolin, um genial palhaço, lá nos idos de 1897. Seriam tempos melhores? Olhou novamente para seu rosto meio palhaço, meio cidadão. Era também o dia de todo os Brasileiros humildes, sem cartão corporativo, sem fundações escrotas, nem ao menos um pedaço das pizzas assadas nas inúmeras CPIs inúteis, para lhe alimentar o corpo, já que a alma foi vendida na igreja da esquina.
Que dia mais triste. Dia do circo. Dia de um choro irônico, sem atenuar com o riso lacônico. Arte circense nascida na antiguidade dos povos Chineses, para preparar soldados para a guerra. Batizada depois dos circos Romanos onde homens, lutavam com leões, tempos difíceis. Como agora, usado, como pejorante pela pujante nação.
A mágica do riso fácil. Do riso doce, duma platéia inocente, esvaída numa sangria de sujeiras institucionais. As lágrimas do velho palhaço, escoam pelos sulcos do rosto, marcados pelos anos de risadas fartas, lavando a maquiagem fresca que escorrega para o peito que já enfarta.
Espera por dias melhores. Como Santos na ânsia de uma vida mais feliz no paraíso. Indaga-se ainda vai demorar muito para este dia. Coloca seu chapéu imitando Chaplin, e como um vagabundo arrasta-se pela rua, totalmente desconhecido. Certo que amanhã, a mesma história, se repetirá.