Conversa com o diretor

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O início de ano letivo é um período bastante envolvente para diretores de colégio. É a época quando novos professores surgem, contemplativos, buscando sedimentar uma possível permanência durante o novo ano que breve se fará presente. Aparentemente alheio a todos esses preparativos, os diretores lá estão em suas salas muito bem planejadas e localizadas dentro do mundo educacional.

Os professores, no afã de cavarem uma nova vaga, planejam estratégias onde os aspectos estéticos são rigorosamente estudados e avaliados. Afinal, vivemos a era das aparências, se não vejamos:

– Bom dia. Eu gostaria de falar com o diretor.

A essa indagação, segue-se todo um processo de orientação cartográfica: “Siga até o final do corredor. Em seguida, pegue à esquerda. É a primeira sala do lado direito após o ginásio”.

– Bom dia! O diretor, por favor.

– Aguarde um instante. Está com visita, responde a secretária.

– Você trabalha aqui? Pergunta a recém chegada a outra senhora.

– Não. Também aguardo. Pretendo uma vaga na área de Geografia. E você?

– Literatura.

A porta é aberta. Uma senhora despede-se e sai.

– As senhoras desejam falar comigo? Diz o diretor.

– Sim! Respondem.

– Entrem.

Entraram. Posicionam-se da melhor forma possível...

– Em que posso ajudá-las?

– Procuro uma vaga.

– Eu também.

– Estamos sem carência de professor. O que posso fazer é ficar com os currículos das senhoras e chamá-las, oportunamente, caso surjam vagas.

– Tudo bem. Aguardaremos – sentenciam tristonhas.

– Tenham um bom dia, senhoras. Lamento.

Instantes depois:

– Diretor? Interfona a secretária.

– Pois não.

– É a sobrinha do deputado Prometeu. Quer falar com o senhor.

– Mande-a entrar.

– Bom dia, senhora!

– Bom dia! Responde arrogantemente a sobrinha do deputado. Meu tio mandou que lesse esta carta de apresentação (a forma como entregou a carta ao diretor creio que seja dispensável comentar).

O diretor começa a leitura. É dispensável narrar o conteúdo também, não? Após a leitura, o diretor fala calmamente:

– Lamento, senhora, mas não temos vagas.

– Como não tem!? Você não leu a carta!?

– Sim! Está muito bem escrita por sinal, mas, como já havia dito, não temos vagas. A senhora quer deixar o currículo? Aparecendo alguma eu poderia convocá-la.

– Currículo! Ah tenha um bom dia, diretor!

– A senhora também.

Felizmente, as aparências enganam e nessa fomos todos enganados, graças a Deus.

Fortaleza – Ce, 07 de março de 1999.

Do meu livro 'Crônicas e mais um conto'.