Histórias de Chuva: GUARÚ SÓ QUER AMAR
“Guarú só quer amar”
É manhã cedinho, vou pegar peixinho. A neblina cobre o córrego. Tá frio. Debaixo do chorão tem coisa, eu sei. Acabei de ver o riscadinho n’água. É guarú. Vou lá.
Não sei o que me deu hoje, mas o céu ainda está escuro. Caiu alguma coisa ali, parece frutinha. Eu não gosto. Sou mais as larvas, principalmente as do mosquito da dengue. Agora que virou moda esse bicho, eu não vou ter mais o que comer.
Legal esse peixinhos. Olha só o colorido daquele macho! Pequeno e rápido. Parece um arco-íris aquático. Vou levar pra casa. Ih, chegou uma fêmea, ela é barrigudinha. Tá cheia. Tá prenha. Aliás, elas vivem grávidas. Nossa, que pique o rapaz tem! Foi cobrir a moçoila em pleno nado. Eu não sabia que peixes tinham bilau.
Não dá para comer e acasalar ao mesmo tempo. Tenho que estabelecer prioridades. Vamos ao amor. Vou fazer uma curva longa e o sol que nasce já-já vai refletir na minha pinta preta. Ela vai achar lindo.
Poxa, será que não vai esquentar. O sereno ainda está molhando. Ah, não é sereno. É chuva. E lá isso é hora de pingar? As gotas vão caindo no remanso do riacho e fazendo círculos e mais círculos. Os peixinhos estão juntando. Dá para pegar com a mão. Mas eu trouxe uma redinha... Vai ser fácil.
Deve ter ventado, os insetos estão caindo de montão. Vamos lá, moçada. Vamos comer bem, hoje. Ops, não é mosquito e nem larva, é chuva. São gotas. E tem um menino com uma redinha de filó. Espalha, espalha.
A chuva aumenta e o frio também. O menino se abaixa e a água fica turva. Os lebistes selvagens saem como raios para debaixo das ramas e algas. Não fica ninguém.
- Vem, filho. Vai chover forte.
- Já vou, mãe. Tô pegando peixinho.
- Pra fazer o quê? Deixa disso.
- Tá bom.
Ainda bem que choveu e espantou o garoto. Quase que minha família se foi, eu também. Santa chuva que inaugura meu dia. Santa chuva. Enquanto isso, vamos aproveitar e nos amarmos agora, peixinha?
JB Alencastro