Com anjos no frio -  Lembranças de Joinville

Ontem foi um dia frio. Estive durante o dia todo envolvido com o meu projeto do DRH e às 18 horas tinha marcado com um amigo para tocarmos Blues. Deu 18h10min, saí correndo para casa. Ao pôr os pés lá fora parece que desliguei-me completamente do trabalho. Senti aquele frio nas orelhas, nos cotovelos... Veio-me, assim, meio de sobressalto, as lembranças de quando eu morara em Joinville. Lá fazia muito frio, mas era um frio gostoso de sentir... Eu adorava agasalhar-me bem e sair pela cidade, bela cidade, sentindo aquele vento gostoso nas bochechas. Onde eu morava, um bairro chamado Atiradores, o mais arborizado da cidade, era ótimo caminhar pelas ruas floridas e com o vento frio batendo no rosto...

Cheguei em casa correndo. Tremia de frio. Tirei a roupa do trabalho, tomei um banho quente e agasalhei-me bem com meias grossas e casaco pesado. Joguei-me no sofá, liguei a TV e fiquei assistindo o A&E Mundo, um canal a cabo... Mas a minha mente insistia em remeter-me à Joinville. Meio que magicamente comecei a sentir o perfume das flores do local. A mente trouxe-me lembranças que eu achava já estarem sepultadas. As ruas sem saída sempre floridas, os bairros de alemães com aquelas crianças de cabecinhas aloiradas, as meninas lindas com os vestidos compridos, super compridos...

De repente, percebi que evocara, um dia antes, os anjos para povoarem o meu apartamento, e agora eu os via, ali, na minha cozinha. Levantei e fui até ao quarto e fiquei olhando para a cabeceira da cama observando um anjo pousado lá folheando o meu livro de cabeceira. Vim caminhado devagarzinho até a cozinha, com cuidado para não fazer barulho. Pisava bem leve, com os pés calçados com meias grossas. Recostei-me no marco da porta, e com as mãos no bolso, corpo jogado de lado, fiquei observando silencioso, para não assustá-los, os anjos confabulando pousados sobre a pia, a geladeira, o fogão...

Assustei-me com o barulho da TV. Voltei correndo e joguei-me no sofá. Despertei do sonho com o aumento repentino do volume da TV por ter entrado em um comercial. Revolvi meu corpo meio com preguiça, para o lado, e afundei-me novamente no sofá. 
Ensaiei levantar-me, mas fiquei por ali sentado, com preguiça, na beira do sofá. Agora desperto, olhei para cada canto de meu apartamento e fiquei imaginando se ainda lembraria-me daquele lugar quando cinco anos se passassem... Imaginei também um anjo ali, não um mas cinco, talvez seis, encarregados de me protegerem... Lembrei-me que essa coisa de anjos começara quando eu recebera um e-mail simples, mas definitivamente profundo, de uma linda colega de trabalho desejando-me, do nada, um bom dia com um anjo ao meu lado.

O frio aumentou mais ainda. A preguiça levou-me novamente para o sofá. Não dei bolas para o Blues que eu iria tocar com o amigo. Estiquei o braço e consegui alcançar uma revista na mesa de centro... Folheei-a, mas não li nada. A joguei de volta na mesinha de centro e adormeci no frio...

Acho que o anjo percebeu que agora poderia descansar e sentou-se me observando adormecer...