Mulher do Metrô
Dias desses consegui viajar sentado no trem do Metrô no trajeto de Pavuna para Centro do Rio de Janeiro. Abri o livro do Wittgeinstein e comecei a ler.
Em alguma estação à frente entrou uma mulher pobre, morena, cabelos molhados provavelmente do banho da manhã, meio ondulados e soltos. Parte caindo pela frente dos ombros, parte caindo por trás. Braços musculosos e veias das mãos bem salientes sugerindo trabalho árduo. O semblante era rígido. Não percebi qualquer vestígio de maquiagem. Os lábios soltos e frequentemente mordidos pelos dentes inferiores. O vestido era simples com flores estampadas de baixa qualidade. Tinha o formato dos seios sugerido pela falta de sutiã, contudo nada indecente. A barriga um pouco maior que o normal para uma pessoa magra. Diria que era meio barrigudinha, mesmo assim ligeiramente sexy.
O vestido descia até próximo dos joelhos. Não tinha qualquer enfeite. Os pés rugosos com as veias também à mostra. Os dedos enfileirados, Os quatro menores indecentemente separados do maior pela tira da sandália rosa. Unhas dos pés pintadas de gelo, única vaidade que notei. Uma bolsa de plástico aparentando couro falso estava pendurada pela alça, bem acomodada em seu ombro esquerdo, que, por sua vez, estava à mostra.
Parei de ler Wittgeinstein para observá-la atentamente. Ela estava recostada entre o final do banco à minha frente, do outro lado do vagão, e a beira da porta. O ombro cuidava em manter o resto do corpo um pouco distanciado da parede do trem. Devia ter não mais que vinte e sete anos. Bonita mulher, rosto bem desenhado, contudo sem brilho e expressão. Fiquei tentando adivinhar a sua profissão. Julguei que fosse uma empregada doméstica, mas pela hora, quase nove da manhã, ou estava atrasada ou tinha outra profissão.
Enfim, fiquei imaginando aquele corpo por baixo da roupa. A sua barriguinha protuberante formando um colo acolhedor. Como disse, os seios bem formados e provavelmente um umbigo discreto. Vez outra, pelo balançar do trem, ela mudava a posição dos pés chamando-me a atenção os seus dedos enfileirados sobre a sandália. O trem estava cheio e tive dificuldade em continuar reparando-a. Talvez isto tenha-me feito forçar o olhar, e ela percebeu-me. Olhou-me naturalmente. Apertou mais uma vez os lábios e desviou logo o olhar. Outra vez trocou a posição do pé de apoio e passou a mão direita sobre o cabelo. Aproveitou, ainda, para arrumar a alça da bolsa, que teimava em escorregar de seu ombro esquerdo.
Voltei para a leitura de meu livro. Quando tornei olhá-la, não mais a encontrei. Descera em alguma estação. Fiquei meio frustrado. Ajeitei-me no banco, curvei um pouco mais a cabeça e voltei à minha leitura.
Bem, não a perdi, claro. A descrevi aqui.
A lembrança da mulher do metrô, vez outra volta à minha mente. A beleza pode ter uma representação muito particular, concluo.
Dias desses consegui viajar sentado no trem do Metrô no trajeto de Pavuna para Centro do Rio de Janeiro. Abri o livro do Wittgeinstein e comecei a ler.
Em alguma estação à frente entrou uma mulher pobre, morena, cabelos molhados provavelmente do banho da manhã, meio ondulados e soltos. Parte caindo pela frente dos ombros, parte caindo por trás. Braços musculosos e veias das mãos bem salientes sugerindo trabalho árduo. O semblante era rígido. Não percebi qualquer vestígio de maquiagem. Os lábios soltos e frequentemente mordidos pelos dentes inferiores. O vestido era simples com flores estampadas de baixa qualidade. Tinha o formato dos seios sugerido pela falta de sutiã, contudo nada indecente. A barriga um pouco maior que o normal para uma pessoa magra. Diria que era meio barrigudinha, mesmo assim ligeiramente sexy.
O vestido descia até próximo dos joelhos. Não tinha qualquer enfeite. Os pés rugosos com as veias também à mostra. Os dedos enfileirados, Os quatro menores indecentemente separados do maior pela tira da sandália rosa. Unhas dos pés pintadas de gelo, única vaidade que notei. Uma bolsa de plástico aparentando couro falso estava pendurada pela alça, bem acomodada em seu ombro esquerdo, que, por sua vez, estava à mostra.
Parei de ler Wittgeinstein para observá-la atentamente. Ela estava recostada entre o final do banco à minha frente, do outro lado do vagão, e a beira da porta. O ombro cuidava em manter o resto do corpo um pouco distanciado da parede do trem. Devia ter não mais que vinte e sete anos. Bonita mulher, rosto bem desenhado, contudo sem brilho e expressão. Fiquei tentando adivinhar a sua profissão. Julguei que fosse uma empregada doméstica, mas pela hora, quase nove da manhã, ou estava atrasada ou tinha outra profissão.
Enfim, fiquei imaginando aquele corpo por baixo da roupa. A sua barriguinha protuberante formando um colo acolhedor. Como disse, os seios bem formados e provavelmente um umbigo discreto. Vez outra, pelo balançar do trem, ela mudava a posição dos pés chamando-me a atenção os seus dedos enfileirados sobre a sandália. O trem estava cheio e tive dificuldade em continuar reparando-a. Talvez isto tenha-me feito forçar o olhar, e ela percebeu-me. Olhou-me naturalmente. Apertou mais uma vez os lábios e desviou logo o olhar. Outra vez trocou a posição do pé de apoio e passou a mão direita sobre o cabelo. Aproveitou, ainda, para arrumar a alça da bolsa, que teimava em escorregar de seu ombro esquerdo.
Voltei para a leitura de meu livro. Quando tornei olhá-la, não mais a encontrei. Descera em alguma estação. Fiquei meio frustrado. Ajeitei-me no banco, curvei um pouco mais a cabeça e voltei à minha leitura.
Bem, não a perdi, claro. A descrevi aqui.
A lembrança da mulher do metrô, vez outra volta à minha mente. A beleza pode ter uma representação muito particular, concluo.