O passar do tempo

O passar do tempo

Numa bela tarde, olhei meu diploma e levei um susto se passaram vinte e quatro anos, e onde eu estava neste tempo todo, não sei... Apavorou-me sentir o passar do tempo quando olhei as datas: 1985..... Não entendo, olho-me no espelho e não sinto este tempo que transbordou nas datas dos documentos. Há algumas marcas no meu rosto, vincos que lembram um papel amassado, não tão triturado como aqueles que jogamos ao lixo, este é meu consolo ainda... Mas os cabelos, quanta diferença... Há tantos fios brancos escondidos misteriosamente pela mágica das tinturas que nem ouso pensar na vida com cabelos naturais. A cor original se perdeu... Já fui castanha, loira, ruiva, morena, já fui tantas, hoje sou quase nada... Em que espelho a minha face se perdeu? Parafraseando a poeta Cecília que sabia tão bem mostrar a passagem do tempo dilacerando nossa aparência externa e interna.

Olho pra trás e ainda me vejo uma guria cheia de sonhos, no entanto, a data de nascimento me restringe em muitas coisas. Mesmo que na aparência física ainda esteja bem, fruto de malhação, cremes e disfarces típicos da mulher que tenta reter a juventude. Alguém me disse, um dia, como consolo: és sábia, tens cultura, conheces a vida, está quase na “melhor idade”, te aposentas daqui alguns anos!!! Ai, como me doou a palavra aposentadoria, lembra um chinelo descartado. Não me sinto velha!! Entretanto, o tempo passou, foi varrendo tudo ao redor, deixou muitas coisas boas também, os filhos, a profissão e a tal da sabedoria... Essa mesma astúcia cantada em verso e prosa, na maioria das vezes, eu não sei o que fazer com ela. Até porque quando começam a nos chamar de “senhora” na maioria dos lugares que chegamos e nos tornamos transparentes ao lado das jovens de trinta anos, a tal sabedoria vai para o lixo, e baixa o ódio da fêmea esquecida...

Não acredito em juventude aternizada pelas cirurgias plásticas, não quero ficar uma “Barbie” deformada e motivo de chacotas pela maioria das pessoas, principalmente as mais jovens. Entretanto, machuca a descartabilidade que a sociedade consumista impõe a mulher, todos os produtos são dirigidos às jovens na faixa de vinte a trinta anos. Quando se entra em determinadas lojas se recebe um olhar de complacência mesclado com leve tom de ironia na pergunta: deseja alguma coisa, senhora ? O que fazer com o tempo que passou comprimindo tudo ao redor... O que fazer com os devaneios que insistem em martelar nossas noites de insônia... O tempo... O tempo se tornou curto, apressado. A maioria das fantasias deve ser a curto prazo. Entretanto, ainda me sinto uma garota, minha alma possui rebeldia, aspiração, vontades, projetos... Não sei vou conseguir realizá-los, mas vou ficar indecentemente tentado.. Nem que seja para ouvir as outras pessoas jovens dizerem: que velha guerreira, sonhadora, afinal, ela é brasileira não desiste jamais....

Isa Piedras

17/03/2008