SEXTA FEIRA !

 

 

   Sexta feira que não era dia 13. Tem coisa melhor ? Ainda mais que era aniversário do nosso grande amigo e colega de trabalho, o João Leitão. Muita gente pode estar na dúvida sobre o motivo pelo qual chamamos o aniversariante de João Leitão. É simples.

   Primeiro porque ele permite, gosta e até nos incentiva a chamá-lo assim. Segundo porque seria muito difícil que uma pessoa de um metro e noventa, cento e tantos quilos de peso, com uma enorme barriga e um apetite muito maior fosse chamado de garnizé ou cangurú.

   Ele mesmo não gostaria. Mas o que importava mesmo é que nossa turma, após o expediente iria em comboio para o barzinho da esquina onde no máximo até as dez, onze horas da noite tomaríamos aquele chope geladinho e teríamos a oportunidade de devorar algumas travessas de bolinhos de bacalhau ( para que não haja controvérsia, gostaria de esclarecer que quando vamos ao nosso barzinho o que comemos são os bolinhos e não as travessas).

   Tudo estava perfeito e até dava para desconfiar. O chefe tinha ido embora mais cedo, o bônus foi pago adiantado, o calor estava de rachar, a Soninha ia de saia rodada (se bem que a Soninha sempre usava saia rodada quando estava com o noivo, que era muito compreensivo, tolerante e generoso na hora de dividir as despesas).

   A previsão era de que a comemoração seria perfeita e que nada daria errado. A única coisa que incomodava era uma ligeira dor de cabeça e pequenas cólicas que eu acreditava serem coisas passageiras, talvez por culpa da feijoada das sextas-feiras.

   Finalmente os relógios de todos os interessados em acabar logo com o expediente marcaram exatamente 17:29 e assim, pontualmente às 17:33 nossa turma já fazia fila a espera do elevador. Entretanto, alguma coisa não ia bem com meu intestino. A dor de cabeça cedeu um pouco mas as cólicas continuavam a me incomodar.

   Enquanto o elevador descia , perdido em meus pensamentos eu procurava me lembrar do que poderia, digamos assim, não ter caído bem no almoço. Não foi o paio, nem a lingüiça e nem o torresmo. Muito menos a carne seca, o lombinho e de forma alguma a caipirinha. A costelinha, nem pensar. Só podia ter sido o cafezinho.

   Chegamos, cada um tomou o seu lugar e com todos falando ao mesmo tempo (menos eu) o pedido foi unânime : chope para todo mundo e bolinhos de bacalhau com muito azeite.

   Como as cólicas estavam aumentando levantei-me para ir ao banheiro mas antes, pedi silêncio e avisei o garçom e aos companheiros de mesa que só ia tomar água mineral com gás. Vocês não imaginam o silêncio sepulcral que se seguiu. Todos olharam na minha direção , inclusive quem estava nas mesas próximas.

   Depois de alguns minutos de perplexidade foi o João Leitão quem quebrou o gelo e pediu para que eu repetisse o pedido. Suando frio e com voz trêmula eu repeti que queria água mineral e com gás.

   Ninguém acreditou (pensaram que não passava de mais uma brincadeira de mau gosto) e em seguida ouviu-se uma estrondosa gargalhada (inclusive dos que estavam na mesa ao lado).

   Eu estava pálido e falando com dificuldade pedi ao garçom a chave do banheiro. O dono do bar, nosso velho conhecido veio em meu socorro e naquele sotaque português carregado explicou aos amigos e fregueses fiéis que aquilo não passava de uma brincadeira . Mas não era.

   Minhas cólicas aumentavam, eu estava muito pálido e suava em bicas. Chegou a primeira bandeja de chopes e o João pediu para todos brindarmos. Só minha água não veio e pelo jeito não viria. Peguei um copo de chope e percebi que minha mão tremia.

   Sussurrei ao ouvido do garçom que precisava da chave do banheiro com a maior urgência mas ele me disse para aguardar mais um pouco que alguém estava limpando ou pulverizando os vasos sanitários, ou coisa assim. Eu estava ficando meio tonto. E aí chega uma hora que não tem mais como segurar. Eu precisava ir ao banheiro com extrema urgência. O caso era sério.

   Só que o banheiro masculino continuava fechado , o João e os colegas (inclusive a Soninha), insistiam para que eu virasse logo o meu chope e aí, nesse momento chegam os famosos bolinhos de bacalhau, cheirosos, lindos , altamente apetitosos e convidativos. Minha barriga deu um nó e não vi outro jeito senão sair correndo para o bar do outro lado da calçada.

   Entrei direto e nem perguntei se o banheiro estava ocupado. Graças aos céus cheguei à tempo. À tempo de encontrar a porta do banheiro fechada a sete chaves. Andando com dificuldade voltei para o balcão do bar e pedi uma das sete chaves do banheiro. O garçom me pediu para aguardar só um pouquinho e de fato, uma eternidade depois me entregou uma argola de aço com inúmeras chaves, todas absolutamente iguais.

   Disparei para o banheiro, experimentei todas as chaves e com a última, finalmente, consegui abrir a porta do meu salvador. Que alívio !

   Minha aventura (ou desventura) naquela sexta feira termina no exato momento em que apago a luz do abajour de cabeceira. Depois que saí do banheiro voltei ao nosso barzinho, dei um abraço no João Leitão, comi só dois bolinhos de bacalhau e tomei duas garrafas pequenas de água mineral com gás.

   Depois cumprimentei os outros colegas (outro abraço só dei na Soninha) e no caminho de volta prá casa só tive mais um pouquinho de cólica, nada que não pudesse aguentar...

 

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CONSELHO : Cuidado com a feijoada das sextas feiras . Não abuse do cafezinho. Você corre o risco de sentir cólicas horríveis...




(.....imagem google.....)

WRAMOS
Enviado por WRAMOS em 15/03/2008
Reeditado em 09/01/2013
Código do texto: T902847
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