Crônica insensata de uma in-comum quarta-feira
Edson Gonçalves Ferreira
Acordo com a sensação de que o gato do País das Maravilhas está ali, na minha janela, sorrindo pra mim, mais enigmático que a Monalisa. Falando nisso, a Monalisa é o retrato de quem? Talvez, o sorriso do gato seja porque quarta-feira é meio de semana e este mês é o mês que a gente tem a vontade de chamar a Rainha para cortar a cabeça dos políticos que, no Brasil, matam a gente, todo início de ano. Temos que pagar IPTU, IPVA, Taxa de Licenciamento de Veículo, Seguro Obrigatório e outras taxas enquanto o salário dos aposentados subiu só 5%. Preciso de chá que Alice experimentou, porque, já pela manhã, esse gato está mangando é de mim.
Ontem, quando liguei a televisão, só vi comentários sobre a poluição na Terra, sobre o problema de brasileiros que foram barrados em aeroportos internacionais na Europa. Luciana Gimenez estava entrevistando um modelo que foi, em São ou no Rio, não sei, impedido de continuar o vôo e, então, esmurrou a porta do avião até machucar sua mão.
Revanche? Sei lá, só sei que o mundo está perdido. Escuto Carmem Miranda cantando: “Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar, por causa minha gente lá de casa começou a rezar e até disseram que o sol ia nascer antes da madrugada... Acreditei nessa conversa mole... e fui tratando de aproveitar... Beijei na boca de quem não devia e o tal do mundo não se acabou”. É uma música de Assis Valente, linda que muita gente, agora, não conhece por causa do “creu”, credo!
Estão vendo? Lewis Carrol não foi tão doido assim quando escreveu “As aventuras de Alice no país das maravilhas”. Há muita coisa em todos os países que parece que saíram do livro. Hoje é quarta-feira, já escutei a lista de pecados que o Papa anunciou. O maior pecado do mundo é não amar o próximo como a nós mesmos. Acho que esse pecado basta.
Se todo mundo o respeitasse, o mundo seria melhor. Não precisa de cartilha, nem de lista de pecado novo. Convidei a Lebre de Março e o Chapeleiro do País das Maravilhas para tomar café-da-manhã comigo. A Lebre de Março disse, então: “Gosto daquilo que consigo”.Tem sentido e não tem. No Brasil, muitos políticos só gostam daquilo que conseguem, é mentira ou verdade?
Acabei de pegar o carnê para pagar IPTU e IPVA. E vou enfrentar fila. Não há santidade alguma em fila, há? A gente quer xingar até a mãe. Também, até o meu salário já está indo para o ralo e, hoje, ainda é o dia 12. Político tem isenção de IPTU, se tiver, eles todos merecem o inferno. Ai, a Lebre de Março vai ter que me emprestar o relógio dela, pois ele não marca o dia do mês, mas não marca hora. Ontem, antes de ir dormir, tive a sensação de que moro em um mundo louco. Tem bala perdida, tem homem-bomba, tem avião-bomba, tem...
Há tanta coisa esquisita, não há, que nem eu e nem você conseguimos nomear. Nós parecemos mesmo é com os soldados da Rainha de Copas que, no livro, são cartas de um baralho. Somos iguaizinhos e depende apenas de um ventinho para nos derrubar, se a Rainha não cortar as nossas cabeças antes, não é verdade.
Por isso, hoje, quarta-feira, vou largar Lewis Carrol e pegar Saint-ex e flutuar com as lições do Pequeno Príncipe. Eu quero a minha rosa para amar. Ela pode estar até noutro planeta que eu vou atrás dela. Enquanto isso, eu fico com a raposa que adora o ritual do namoro. Como música de fundo para o meu dia, vou colocar “Carinhoso”, de Pixinguinha, cantado por Elis Regina, você não quer passar o dia comigo hoje?
Divinópolis, 12.03.08