A bailarina
e o dia da mulher
Fui instado a justificar por que não havia escrito uma crônica sobre a mulher, no dia 8 de março, o seu dia. Amigas que me leem, acharam que eu devia ter escrito "nem que fosse meia página".
Disse-lhes que não o fizera porque me faltava talento para tanto. Fiz ver a elas que só os poetas sabem falar sobre a mulher: a sua; a dos outros, e a de ninguém.
Refutaram, com veemência, a minha assertiva. E ainda lembraram que, brilhando por esse mundo afora, existem inolvidáveis prosas enaltecendo o valor, o charme, a sedução e a dignidade da mulher.
Exemplificando, apontaram as crônicas do Artur da Távola, em "A Mulher é Amor", livro que conheço, página por página, e que deve ser lido dezenas de vezes.
O certo é que, apesar do meu solene blábláblá, não consegui convencê-las da minha total incapacidade de escrever um só parágrafo sobre a mulher. Nem sobre seu copo? Houve quem perguntasse...
Até lhes propus transcrever poemas apaixonados do poeta Castro Alves. Podia ser aquele em que o vate baiano diz pra sua amada: " Não sabes, criança? Sou louco de amores.../ Prendi meus afetos, formosa Pepita.../ Mas onde? No tempo, no espaço nas névoas/ Não rias, prendi-me/ Num laço de fita."
Ou homenagear a mulher transcrevendo versos da incomparável Cora Coralina, poetiza com espaço na minha mesinha de cabeceira, já transbordando de belos livros.
Elas, inconformadas (!), queriam porque queriam que eu escrevesse sobre a mulher. - "Se preferir, sobre uma mulher que te deixou saudades", disse uma delas. Fui, então, buscar nas minhas lembranças mais remotas o rostinho estonteante de Leninha, uma doce e inocente bailarina. Volvidos tantos anos, e ainda não conseguira esquecê-la completamente.
Recordando-a, estaria homenageando a mulher, e, ao mesmo tempo, satisfazendo, embora palidamente, o desejo de minhas sôfregas e inconformadas amiguinhas. Foi o que imaginei.
Fui um frequentador constante dos circos de lona. Não perdia os espetáculos do "Nerino", do "Garcia", e de outros circos menos badalados. Instalava-se um picadeiro, e lá estava eu batendo palmas pros palhaços. Pena que os bons - eu disse os bons - circos populares, incluindo os aqui citados, tenham desaparecido.
Está por aí o Soleil. Muito caro e não sei se no seu elenco brincam bons palhaços. Os circos valem, principalmente, pelos seus palhaços. Penso assim. Fazer rir, não é fácil.
Se, naqueles tempos, já era difícil arrancar sorrisos, nos nossos dias, só um extraordinário palhaço será capaz de transformar as "lágrimas" do "respeitável público" em gargalhadas.
Pois bem. Foi num circo mambembe que conheci Leninha. Do nordeste, pequena, tez morena, pernas provocantes, coxas suplicantes, seios túrgidos e bem-visíveis, olhos redondos, pretos, faiscantes e sedutores, Leninha era assim...
Apaixonei-me por ela... Nada a estranhar. Disse o maravilhoso Artur da Távola, em uma de suas belas crônicas, que "a mulher vive para seduzir mesmo quando não o faça conscientemente. Faz parte de sua profunda constituição biológica".
Leninha não sabia da existência deste romântico cronista e de sua louca paixão por ela. Como, então, abordá-la? Essa indagação me roubou algumas horas de sono. Incrível!
Nesse tempo, trabalhando em um jornal de Fortaleza, resolvi conquistá-la, escrevendo uma carinhosa matéria sobre a vida de uma bailarina de circos. Foram horas, muitas horas, em cima da minha velha Olivetti, até sair algumas laudas.
A matéria, entretanto, para meu desespero, não foi publicada. Desconfio, ainda hoje, que a redação do jornal descobriu, a tempo, que minha reportagem não passava de uma declaração de amor. E era.
De Leninha, passados mais de sessent´anos, guardo, apenas, seu retratinho: um recorte do jornal que lhe dava discreta cobertura.
Busquei-o para rabiscar esta crônica. Ele estava numa pasta já bastante amarelada e cheirando a naftalina, com esta identificação: Saudades de Leninha - 8 de março de 1956 - Fortaleza, Ceará.
e o dia da mulher
Fui instado a justificar por que não havia escrito uma crônica sobre a mulher, no dia 8 de março, o seu dia. Amigas que me leem, acharam que eu devia ter escrito "nem que fosse meia página".
Disse-lhes que não o fizera porque me faltava talento para tanto. Fiz ver a elas que só os poetas sabem falar sobre a mulher: a sua; a dos outros, e a de ninguém.
Refutaram, com veemência, a minha assertiva. E ainda lembraram que, brilhando por esse mundo afora, existem inolvidáveis prosas enaltecendo o valor, o charme, a sedução e a dignidade da mulher.
Exemplificando, apontaram as crônicas do Artur da Távola, em "A Mulher é Amor", livro que conheço, página por página, e que deve ser lido dezenas de vezes.
O certo é que, apesar do meu solene blábláblá, não consegui convencê-las da minha total incapacidade de escrever um só parágrafo sobre a mulher. Nem sobre seu copo? Houve quem perguntasse...
Até lhes propus transcrever poemas apaixonados do poeta Castro Alves. Podia ser aquele em que o vate baiano diz pra sua amada: " Não sabes, criança? Sou louco de amores.../ Prendi meus afetos, formosa Pepita.../ Mas onde? No tempo, no espaço nas névoas/ Não rias, prendi-me/ Num laço de fita."
Ou homenagear a mulher transcrevendo versos da incomparável Cora Coralina, poetiza com espaço na minha mesinha de cabeceira, já transbordando de belos livros.
Elas, inconformadas (!), queriam porque queriam que eu escrevesse sobre a mulher. - "Se preferir, sobre uma mulher que te deixou saudades", disse uma delas. Fui, então, buscar nas minhas lembranças mais remotas o rostinho estonteante de Leninha, uma doce e inocente bailarina. Volvidos tantos anos, e ainda não conseguira esquecê-la completamente.
Recordando-a, estaria homenageando a mulher, e, ao mesmo tempo, satisfazendo, embora palidamente, o desejo de minhas sôfregas e inconformadas amiguinhas. Foi o que imaginei.
Fui um frequentador constante dos circos de lona. Não perdia os espetáculos do "Nerino", do "Garcia", e de outros circos menos badalados. Instalava-se um picadeiro, e lá estava eu batendo palmas pros palhaços. Pena que os bons - eu disse os bons - circos populares, incluindo os aqui citados, tenham desaparecido.
Está por aí o Soleil. Muito caro e não sei se no seu elenco brincam bons palhaços. Os circos valem, principalmente, pelos seus palhaços. Penso assim. Fazer rir, não é fácil.
Se, naqueles tempos, já era difícil arrancar sorrisos, nos nossos dias, só um extraordinário palhaço será capaz de transformar as "lágrimas" do "respeitável público" em gargalhadas.
Pois bem. Foi num circo mambembe que conheci Leninha. Do nordeste, pequena, tez morena, pernas provocantes, coxas suplicantes, seios túrgidos e bem-visíveis, olhos redondos, pretos, faiscantes e sedutores, Leninha era assim...
Apaixonei-me por ela... Nada a estranhar. Disse o maravilhoso Artur da Távola, em uma de suas belas crônicas, que "a mulher vive para seduzir mesmo quando não o faça conscientemente. Faz parte de sua profunda constituição biológica".
Leninha não sabia da existência deste romântico cronista e de sua louca paixão por ela. Como, então, abordá-la? Essa indagação me roubou algumas horas de sono. Incrível!
Nesse tempo, trabalhando em um jornal de Fortaleza, resolvi conquistá-la, escrevendo uma carinhosa matéria sobre a vida de uma bailarina de circos. Foram horas, muitas horas, em cima da minha velha Olivetti, até sair algumas laudas.
A matéria, entretanto, para meu desespero, não foi publicada. Desconfio, ainda hoje, que a redação do jornal descobriu, a tempo, que minha reportagem não passava de uma declaração de amor. E era.
De Leninha, passados mais de sessent´anos, guardo, apenas, seu retratinho: um recorte do jornal que lhe dava discreta cobertura.
Busquei-o para rabiscar esta crônica. Ele estava numa pasta já bastante amarelada e cheirando a naftalina, com esta identificação: Saudades de Leninha - 8 de março de 1956 - Fortaleza, Ceará.