"A TURMA DOS ANDRADAS"

A TURMA DA RUA DOS ANDRADAS

Nessa contemporaneidade de vida, salvo em algum sitio da periferia da cidade, a criançada não conhece o que é turma de rua. É um bando de moleques que moram na mesma rua, no mesmo quarteirão que se juntam para brincarem, jogarem bola, arremessar pião, pular mana-mula, andar de patinete e azucrinar a vida dos vizinhos com carrinho de rolimãs. Alguns estudam no mesmo colégio, outros não. Tem maiores, menores, mas todos se unem na algazarra e chutam bola de meia em plena calçada. Não raro uma vidraça vai para o beleléu. A turma ressabiada encosta-se à parede como se fossem uns anjinhos. Passada a bronca, continuam a frenética disputa. Quando não, resolvem apertar as campainhas de vizinhos enxeridos; aqueles que não comungam com o ideal das brincadeiras e vivem reclamando junto aos pais da péssima conduta dos filhos. Tem mais, o pão e o leite depositados à porta do freguês, por encanto somem, para satisfazer a birra de alguém que naquele dia acordou com o diabo no corpo. Assim, falavam as mães. Nos degraus das entradas das casas, dos prédios jogavam-se figurinhas, “bafa”, “tatadeixa” e variações outras. Mas, a coisa pegava fogo no jogo de botões. O goleiro original era substituído por uma caixa de fósforos, sustentada por moedas ou algum pesinho de chumbo. Os jogadores titulares eram descartados, só o emblema do time aproveitado. A caça por craques era uma tarefa que exigia conhecimento, argúcia e muita lixa. A caçada se dava no interior dos guarda-roupas, onde sobretudos, capas e ternos dormiam à espera do caçador, que via naquele botão grande marrom o seu zagueiro preferido e aquele pretinho, bem que daria um bom centro-avante. O custo dessa aventura significava alguns tapas, beliscões e o castigo de não poder sair de casa por algum tempo. Mesmo porque, a chave era retirada da porta e no avental da mãe depositada. Se tentasses agradar o caldo entornaria, e mais alguns petelecos sofrias. Conquista máxima, era poder contar no elenco com fichas de jogo. Tive uma, cor-de-rosa, de valor 200 que deslizava e dava capote como ninguém. Chamava-se Liquinho, hoje não me lembro porque. A bolinha era de miolo de pão ou ainda de cortiça, oriunda de uma rolha que o safado sem a menor cerimônia destapou da garrafa do Vinho do Porto. Brigas houve, muitas. Ficar sem se falar, desdizer do adversário eram práticas comuns que não duravam muito tempo. Bastava um assobio, para que o assanhamento se mostrasse e as pazes eram feitas. Contudo a rixa, a rivalidade se impunha com outras turmas. Não havia amistosidade entre a turma dos Andradas e da General Osório, ou das Gusmões com a do Triumpho. Todas eram inimigas entre si. Ai daquele, que sozinho perambulasse pelo território alheio. Sei bem disso, embora não conste dos boletins específicos, já naquela época sem o saber tinha batido todos os recordes dos cem aos oitocentos metros com barreiras, com pavor, com medo e chamando pela minha Mãe. Por hoje é só minha gente. Quem sabe! Eu conto mais.

paulo costa

março/2008

paulo costa
Enviado por paulo costa em 11/03/2008
Reeditado em 11/03/2008
Código do texto: T896348
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