VIDAS SEM NORTE
Domingo passado abro o jornal e me deparo com as fotos de três ex-alunos meus. Estavam na página policial. Não tinham sido presos. Pior. Estavam mortos. Suas fotos ilustravam o cotidiano daqueles que enveredaram pelos caminhos da marginalidade e das drogas. Jovens ainda, recém saídos da meninice, sequer desfrutaram da mocidade que chegava e que devia ser acompanhadas das coisas boas, das coisas construtivas, dignificantes e duradouras.
Suas histórias de vida não diferem muito das histórias que costumamos ouvir contar, infelizmente. Logo são recrutados pelas maravilhas do mundo; ora por não terem o que fazer; ora porque são obrigados a sair de dentro de suas casas, pois o medo de maus tratos, por parte dos pais ou padrastos, os expulsam do único lugar que ainda é uma fortaleza para as suas seguranças; ora por não terem do que se alimentarem e encontram, no pedir, a melhor alternativa. Isso é o começo de tudo.
Conheço a história de todos. Filhos de pais separados, famílias completamente desestruturadas, sem rendas fixas, passam a catar lixo e vender ferro, cobre e alumínio, nos ferros velhos das redondezas, como meio de sobrevivência. A escola é o paliativo da merenda e o lazer das tardes, embora a sala de aula seja entediante. Praticamente não assistem à aula. Preferem cabulá-la e ficarem de “bobeiras” na quadra da instituição – onde por falta de segurança e de um muro isolador, entre a rua e o domínio da escola – sempre estão em contato direto com o que de pior pode ocorrer em suas já frágeis auto-estimas: os desocupados e os donos da rua.
Daí para serem aliciados não custa muito. A própria curiosidade, e o desejo de também se tornarem “boys”, com prestígio e respeito da malandragem, é um pulo. No início, quando detectado o envolvimento, a equipe de educadores ainda consegue retardar a degradação, porém, não é por muito tempo.
Muitos encontram nessas substâncias proibidas, o sonho de serem senhores de si, capazes de possuírem suas motos, tornarem-se importantes, terem celulares, roupas de marcas, óculos esportivos e mp4. São sonhos e fantasias sem nenhuma ambição maior. Essas ilusões os levam, às vezes, a consumirem seguidamente as pedras malditas e as colas devastadoras, de tal forma, que ficam estáticos no chão, sem forças para se levantarem, num estágio chamado por eles, de “entre o céu e o inferno”.
Esforços são feitos para se resgatar, pelo menos, uma parte mínima desses jovens e reintroduzi-los no convívio escolar. Tentativas são organizadas para seduzi-los, dentre elas, palestras de autoridades e especialistas, testemunhos de ex-viciados, mas não adianta: o poder de sedução é infinitamente inferior ao brilho do transe instantâneo. Entretanto, esse estágio ainda é passível de retorno. Alguns deles encontram na atividade cultural – tipo aula de dança, de violão, percussão, aula de teatro e de capoeira – o apoio que necessitam para se afirmarem, elevando suas auto-estimas e os livrando dos malefícios, não só das drogas, mas e principalmente, daqueles que os aliciam e os condenam a uma vida sem futuro.
É triste ver essa degradação, que não ocorre lentamente, mas numa velocidade espantosa, a ponto de cortar qualquer coração calejado. Do incentivo inicial dos distribuidores, eles passam a não terem como adquirir o produto para suas necessidades pessoais. É a fase do aviãozinho. Levam e trazem. E consomem. E se endividam. Aí só tem um jeito de pagar para não serem mortos: subtrair. Nesse ponto a polícia entra em cena. Muitos são encaminhados para as casas de apoio e juizados de menores. Liberdade cerceada, desespero pelas drogas, fugas em bandos. Novos delitos, novos encaminhamentos. Uma fase cíclica sem a mínima chance de recuperação.
O estágio seguinte é a da violência total. Não importa mais o sentido da vida. Tanto faz tirar uma vida como ser tirado dela. Brigam entre eles, cada um querendo ser o maioral, o “dono do pedaço”. Não existem mais regras sociais, valores morais, respeito pelo próximo: o desrespeito é total e tiram-se vidas como se fosse à coisa mais banal do mundo. Tornam-se blindados em sentimentos de carinho e bondade. Já não enxergam as cores naturais ao seu redor, mas e apenas, o colorido dos seus próprios fantasmas que os atormentam por mais e mais substâncias que os deixam, além disso, lesivos ao contato humano.
Assim aconteceu com os três. Seus anseios de posse e poder; seus sonhos e projetos tiveram um final trágico: foram eliminados pelos próprios companheiros de “parada”, com requintes de crueldades. E a vida? A frase de Rubens Coelho no seu artigo “A vida Sem Valor” resume o conceito: “... a vida perdeu o seu valor, não significa nada para muitas criaturas sem fé e sem Deus, numa sociedade que se diz civilizada, porém, desumanizada”.
Domingo passado abro o jornal e me deparo com as fotos de três ex-alunos meus. Estavam na página policial. Não tinham sido presos. Pior. Estavam mortos. Suas fotos ilustravam o cotidiano daqueles que enveredaram pelos caminhos da marginalidade e das drogas. Jovens ainda, recém saídos da meninice, sequer desfrutaram da mocidade que chegava e que devia ser acompanhadas das coisas boas, das coisas construtivas, dignificantes e duradouras.
Suas histórias de vida não diferem muito das histórias que costumamos ouvir contar, infelizmente. Logo são recrutados pelas maravilhas do mundo; ora por não terem o que fazer; ora porque são obrigados a sair de dentro de suas casas, pois o medo de maus tratos, por parte dos pais ou padrastos, os expulsam do único lugar que ainda é uma fortaleza para as suas seguranças; ora por não terem do que se alimentarem e encontram, no pedir, a melhor alternativa. Isso é o começo de tudo.
Conheço a história de todos. Filhos de pais separados, famílias completamente desestruturadas, sem rendas fixas, passam a catar lixo e vender ferro, cobre e alumínio, nos ferros velhos das redondezas, como meio de sobrevivência. A escola é o paliativo da merenda e o lazer das tardes, embora a sala de aula seja entediante. Praticamente não assistem à aula. Preferem cabulá-la e ficarem de “bobeiras” na quadra da instituição – onde por falta de segurança e de um muro isolador, entre a rua e o domínio da escola – sempre estão em contato direto com o que de pior pode ocorrer em suas já frágeis auto-estimas: os desocupados e os donos da rua.
Daí para serem aliciados não custa muito. A própria curiosidade, e o desejo de também se tornarem “boys”, com prestígio e respeito da malandragem, é um pulo. No início, quando detectado o envolvimento, a equipe de educadores ainda consegue retardar a degradação, porém, não é por muito tempo.
Muitos encontram nessas substâncias proibidas, o sonho de serem senhores de si, capazes de possuírem suas motos, tornarem-se importantes, terem celulares, roupas de marcas, óculos esportivos e mp4. São sonhos e fantasias sem nenhuma ambição maior. Essas ilusões os levam, às vezes, a consumirem seguidamente as pedras malditas e as colas devastadoras, de tal forma, que ficam estáticos no chão, sem forças para se levantarem, num estágio chamado por eles, de “entre o céu e o inferno”.
Esforços são feitos para se resgatar, pelo menos, uma parte mínima desses jovens e reintroduzi-los no convívio escolar. Tentativas são organizadas para seduzi-los, dentre elas, palestras de autoridades e especialistas, testemunhos de ex-viciados, mas não adianta: o poder de sedução é infinitamente inferior ao brilho do transe instantâneo. Entretanto, esse estágio ainda é passível de retorno. Alguns deles encontram na atividade cultural – tipo aula de dança, de violão, percussão, aula de teatro e de capoeira – o apoio que necessitam para se afirmarem, elevando suas auto-estimas e os livrando dos malefícios, não só das drogas, mas e principalmente, daqueles que os aliciam e os condenam a uma vida sem futuro.
É triste ver essa degradação, que não ocorre lentamente, mas numa velocidade espantosa, a ponto de cortar qualquer coração calejado. Do incentivo inicial dos distribuidores, eles passam a não terem como adquirir o produto para suas necessidades pessoais. É a fase do aviãozinho. Levam e trazem. E consomem. E se endividam. Aí só tem um jeito de pagar para não serem mortos: subtrair. Nesse ponto a polícia entra em cena. Muitos são encaminhados para as casas de apoio e juizados de menores. Liberdade cerceada, desespero pelas drogas, fugas em bandos. Novos delitos, novos encaminhamentos. Uma fase cíclica sem a mínima chance de recuperação.
O estágio seguinte é a da violência total. Não importa mais o sentido da vida. Tanto faz tirar uma vida como ser tirado dela. Brigam entre eles, cada um querendo ser o maioral, o “dono do pedaço”. Não existem mais regras sociais, valores morais, respeito pelo próximo: o desrespeito é total e tiram-se vidas como se fosse à coisa mais banal do mundo. Tornam-se blindados em sentimentos de carinho e bondade. Já não enxergam as cores naturais ao seu redor, mas e apenas, o colorido dos seus próprios fantasmas que os atormentam por mais e mais substâncias que os deixam, além disso, lesivos ao contato humano.
Assim aconteceu com os três. Seus anseios de posse e poder; seus sonhos e projetos tiveram um final trágico: foram eliminados pelos próprios companheiros de “parada”, com requintes de crueldades. E a vida? A frase de Rubens Coelho no seu artigo “A vida Sem Valor” resume o conceito: “... a vida perdeu o seu valor, não significa nada para muitas criaturas sem fé e sem Deus, numa sociedade que se diz civilizada, porém, desumanizada”.
Obs. Imagem da internet