A ambição de Henrique
Por: António Centeio
Era Outono. As folhas caíam com leveza. Até pareciam compreender o despregar da vida. Henrique viu uma folha cair em cima do caixão de seu pai no momento exacto que este descia à terra. Entendeu o sucedido como um sinal divino. O coração de Henrique encolheu. A dor sufocava-o. Sentia como nunca que a vida às vezes não faz sentido. Restava-lhe o orgulho e a grandeza de sua mãe. Despedaçado interiormente pela perda soube que o seu futuro estava ameaçado. Das suas profundezas pensou que os seus sonhos nunca mais seriam aqueles que sempre tinha imaginado porque sabia que entre pai e filho deve existir devoção e ternura como sentimentos afectuosos. Tinha perdido tudo isto com a morte de seu pai no dia anterior.
- Que vai ser de mim? - Clamava amarguradamente Sofia.
- Não chores mãe, porque foi apenas o corpo do pai que desapareceu. Ele estará sempre connosco – disse para que a dor de sua mãe fosse menor.
Henrique compreendia como um adulto. A partir daquele momento a sua vida entraria em mutação permanente. Prometeu solenemente a si próprio naquele local frio mas repleto de lembranças que iria tornar-se um grande homem. Projectos com ousadia e alguma confiança foram os seus desejos para o futuro.
Na sua adolescência nem sempre se preocupava com os sentimentos dos outros mas no seu intimo acabava por viver sempre para os seus amigos. Se queria continuar o seu caminho tinha que fazer aquilo a que se tinha comprometido, caso contrário o vento levaria todos os seus desejos. Sabia mais do que ninguém corrigir os males, pequenos ou grandes, para que brotassem com aquela força que só a natureza sabe dar para aqueles que compreendem os sinais.
«Nunca devemos deixar de sonhar. O sonho comanda a vida. Realizem-se ou não os sonhos nunca devemos desistir deles. Só estes alimentam a nossa alma e nos dão a força para suportar as partidas do destino». Os seus amigos criticavam-no por não participar nas paródias que levavam a efeito. A vida não lhe sorriu quando mais precisava. Sentia como ninguém a falta do bem-estar e da presença do pai. A sua voz interior dizia-lhe para não desmerecer e compreender o esforço que sua mãe fazia para que nada lhe faltasse. A natureza deu-lhe ambição e força para lutar pelos seus objectivos. Sentia o desejo da luta. A vida é uma permanente luta.
Muitas vezes quando se deitava, no silêncio da noite, ouvia as palavras que o seu coração lhe dizia «Não desistas dos teus sonhos. Quando não fores capaz de ultrapassar os obstáculos, contorna-os. Muitas vezes mais não são do que ensinamentos para o futuro. Sê sábio, porque um homem inteligente tenta sempre resolver os problemas antes que eles apareçam» – compreendia nos sinais o segredo do encontro dos desejos. Não ignorava as mudanças previa-as e adaptava-se a elas.
Quando nos sentávamos na esplanada do Açude Real para conversarmos, admirava-o. Não pela sua maneira de falar mas pelo seu génio e ambição. Para quem o conheceu, como eu, que acompanhei de perto a sua criancice como um pouco a sua juventude, merecia toda a minha admiração e respeito. Gostava de ouvi-lo!
«Nada na vida é difícil de aprender. Devemos ouvir as pessoas cujos conselhos são de escutar. Passados uns tempos, aprende-se em quem se pode confiar e em quem não. Nunca devemos dar a ninguém o direito de tomar decisões por nós». Dizia-me para que eu soubesse e compreendesse o sentido das palavras. Admirava Henrique como sentia orgulho na sua mãe e do esforço que esta fez para que o filho triunfasse neste mundo cheio de ironias.
Às vezes até me esquecia que tinha idade para ser meu filho, tal era o seu dom oratório. Sempre o considerei adulto de mais para a idade que tinha. Mas as alfinetadas do tempo já lhe tinham ensinado muito.
Hoje, é um dos principais correctores da Bolsa de Valores. A sua total entrega ao mistério das transações e o esforço para contornar as dificuldades fez dele aquilo que sempre gostou de ser, um homem de negócios.
Foi na Bolsa que conheceu Sandra. Ambiciosa e fria para a grandeza dos números mas com um grande coração. Bem cedo travaram amizade para serem devotados um ao outro (como a lenda romana de Damon e Pítias).
Sandra é uma grande amiga. Só a amizade tem o poder de afastar os medos, de desfazer amarras; a amizade sustêm o golpe fatal amparando a queda, redobra as forças vacilantes e faz o começo daquilo que já era fim. Leva-nos a ter firmeza nas nossas atitudes com persistência nos nossos ideais. Devemos aguardar com paciência que os frutos amadureçam para que possamos apreciar devidamente a sua doçura.
Henrique e Sandra formam um casal digno de admiração. Construíram um castelo com alicerces bem profundos. Com sabedoria dos lucros obtidos criaram uma Fundação para apoio de casas de crianças carenciadas e abandonadas.
As suas horas livres são dedicadas à causa do bem-estar para quem a vida nunca sorriu. O orgulho que sentem naquilo que fizeram e sustentam toca no nosso intimo levando com que, a nossa contribuição não possa passar despercebida. A alegria e o bem-estar das crianças reflecte-se nas suas caras risonhas. Afinal a grandeza do ser humano é infinita.
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