Recordando
    os meus papas



    Pio XI - Cardeal Achille Ratti- foi o meu primeiro papa. Substituiu Bento XV. Ficou na cátedra petrina de 1922 até 1939.  Eu tinha cinco anos de idade, quando Pio XI morreu. Soube muito pouco do que aconteceu no seu pontificado.
   Seu sucessor foi o Cardeal Eugênio Pacelli - "qui sibi nomen imposuit" Pio XII. Depois de Pio XII, vieram João XXIII, Paulo VI, João Paulo I, João Paulo II, e, finalmente, Bento XVI.
    Esses, até aqui, são os meus papas, que aqui os recordo em tempo de Natal.
     Pio XII. Um papa narigudo, solene, litúrgico, majestoso e calado. Como disse alguém, "com uma aparência digna das pinturas de El Greco". Recordo-o, sendo conduzido pelos mortais na Sedia Gestatoria. Na cabeça, uma tiara doirada.
     Foi o último papa a usá-la. Após ser coroado, Pacelli vendeu a tiara papal, e distribuiu o dinheiro arrecadado com os pobres.  A partir de Pio XII, os pontífices adotaram a mitra, também usada pelos bispos. Afinal, o papa é o bispo de Roma.
     Pio XII aparecia pouco. No seu tempo, os papas ainda não eram pastores midiáticos. Viviam, praticamente, escondidos no Vaticano. Isso fazia com que os católicos vissem os papas como santos: Sua Santidade.  Meu bom vigário, no interior do meu Ceará, além de chamar o papa de "Santo Padre", ainda metia na cuca de seus paroquianos, que ele era infalível. 
    Coube ao Papa Pacelli exercer, pela primeira vez, o "infalibile magisterium", definindo a doutrina da Assunção de Maria.  Pio XII despertava um enorme sentimento de piedade, no seio do seu rebanho: dizia-se que ele sofria de sucessivas e incontroláveis crises de soluço.
   Atravessou a Segunda Guerra Mundial em silêncio. Porque não condenou, publicamente, as atrocidades nazistas, foi chamado de o "Papa de Hitler"; embora, nunca se tenha provado sua ligação com o führer. Morreu no dia 9 de outubro de 1958.
     O sucessor de Pio XII foi o Cardeal Angelo Giuseppe Roncalli - "qui sibi nomen imposuit" João XXIII. Apesar da idade avançada, revelou-se um pontífice operoso, humilde, e extremamente simpático. Surpreendeu os radicais do Vaticano recebendo, em audiência particular, o editor-chefe do poderoso jornal comunista Izvestia, que também era genro do, à época, dono da União Soviética, Nikita Khruschev. 
    Convocou e instalou o Concílio Vaticano II, na sua ótica, um meio de "transpor para a linguagem moderna os ensinamentos ancestrais do Cristianismo".  Para seus biógrafos, ele "transformou a face do catolicismo". É lembrado por três de suas encíclicas: a "Mater et Magistra", a "Pacem in terris" e a "Gaudet Mater Ecclesia". Morreu no dia 3 de maio de 1963.
     Para substituí-lo, o colégio cardinalício elegeu o Cardeal Montini - "qui sibi nomem imposuit"  Paulo VI. Foi o primeiro papa a pôr o pé na estrada e sair da Itália. Inaugurou as viagens internacionais, cultivadas, com esmero, pelo Papa Karol Wojtyla. Visitou a sede da ONU, países da Europa e da Ásia. Foi o primeiro Pontífice a pisar em terras africanas.
    Machucou o seu pontificado com a publicação da Encíclica "Humanae vitae": os católicos ficavam proibidos de usar métodos artificiais de anticoncepção.
    Com a Encíclica "Evangelii nuntiandi", teria se recuperado: nela, pensou no social, assemelhando-se aos teóricos da Teologia da Libertação, anos depois criticados, severamente, pela Santa Sé, com a aprovação de um cardeal chamado Joseph Ratzinger. Consta ter sido um papa chegado a crises depressivas. Morreu em agosto de 1978.
     Foi substituído pelo Cardeal Albino Luciani - "qui sibi nomen imposuit" João Paulo I.  Seu pontificado durou 33 dias. Teve morte misteriosa. Uma freira o encontrou morto em sua cela. Fiel a uma tradição milenar, o Vaticano não submeteu seu corpo à necrópsia.  O Papa Luciani não teve tempo para definir seu governo. Foi, apenas, o 261 papa, e o primeiro a usar dois nomes. Morreu no dia 28 de setembro de 1978.
     Depois de 500 anos, a Igreja, com a morte de João Paulo I, ganhou um papa não italiano, o polonês Karol Vojtyla - "qui sibi nomen imposuit" João Paulo II. O último papa nascido fora da Itália fora Adriano VI, um holandês, que reinou de 1522 a 1523.

     Carismático, João Paulo II conquistou multidões.  Mas quase morria atingido pelas balas de Mehmet Ali Agca, na Praça de São Pedro, em maio de 1981. 
    Foi aplaudido por evangélicos, ateus, e agnósticos! Pregou em dezenas de países, ao longo do seu pontificado, que durou 26 anos. Usou a mídia com freqüência e rara felicidade.
    Conquistou os povos com um gesto de impressionante eloqüência e elegância: beijava o chão de cada país que visitava.  Deslumbrou reis, rainhas, imperadores, presidentes e ditadores, levando-os a se curvarem diante da Cátedra de São Pedro.
Mas, nem por isso, deixou de ser um dos  papas mais conservadores. Nunca admitiu discutir a extinção do celibato, e assinou a Carta Apostólica "Odinatio Sacerdotalis", pondo um ponto final no debate em torno da ordenação de mulheres.
        Karol Wojtyla morreu com 84 anos de idade, no dia 2 de abril de 2005. Um papa, como disse, conservador, mas, tudo indica, que não será esquecido tão cedo.
     Para sucedê-lo, foi eleito o cardeal alemão Joseph Ratzinger - "qui sibi nomen imposuit" Bento XVI. Assumiu o comando da Igreja Católica aplaudido por uns, e xingado por outros. Considerado "o mais notável teólogo conservador de sua geração", é, por isso, temido pelo chamado clero progressista. 
        Escolheu o nome de Bento XVI em homenagem a São Bento, o padroeiro da Europa.  Bento XV, que foi um papa conciliador, pode servir-lhe de exemplo.

     Quando escrevo esta crônica, Bento XVI tem poucos meses de reinado. É muito cedo para julgá-lo. 
   O mundo, porém, espera que ele seja o que prometeu, na sua primeira Bênção Apostólica: "Um simples, humilde trabalhador na vinha do Senhor".  Bom reinado, Papa Ratzinger.
   Outros papas virão.
Felipe Jucá
Enviado por Felipe Jucá em 19/12/2005
Reeditado em 15/10/2020
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