Papo de sexta-feira
Edson Gonçalves Ferreira
Cadê o Coelho Maluco, porque estou precisando de tomar chá alucinógeno pra curtir a sexta-feira. A Raínha de Copas anda atrás
de mim. Não agüento mais que ela queira cortar a minha cabeça só
porque sou poeta. Tem gente que julga que sou doido. Contaram-me, há muito tempo e, hoje, me lembrei que, em Divinópolis, existem três pessoas que deviam estar internadas: Adélia Prado, Irene Amaral e eu. Não me julgo digno da companhia de tão boa gente. São duas mulheres fantásticas, nobres, cultas, finas. Quem falou isso, se for verdade, é que é doido.
Logo, à noite, vou dar aula. Há santidade neste mister. Adoro meus alunos. Quando a aula acaba, sinto-me sozinho. Ser celebridade não deve ser grande coisa. Uma hora, você está rodeado de gente bajulando você e, depois, em casa, você está só. Mesmo que a gente esteja com o ser amado, a gente continua sozinho, não é? Não foi à toa que Elis Regina
cantou: "A barra do amor é que ele é meio ermo/A barra da morte é que ela não tem meio termo".
O Coelho Maluco passou aqui na porta, olhou pro relógio e me disse que não tinha tempo. Eu também não, escrevo esta crônica afobado, só para comunicar com gente que ama gente. Eu sou que nem a Emília, a do Narizinho arrebitado, gosto de todas as criaturas.
Ela é amiga até de um sabuco de milho, de um porco metido à besta.
Já escuto alguém dizendo que eu também sou metido. Num sou não.
Sou é amalucado por causa da poesia. Ela me pega, me arrasta, me leva para regiões desconhecidas. Eu vou, porque acho que com a poesia eu me consagro ou me dano. E, afinal de contas, quem escreve poesia, vive mais a vida, porque vai revivendo o que viveu. Lembro-me de Fernando Pessoa: "Todos os mares, todos os estreitos, queria apertá-los bem ao peito e, depois, morrer". É assim que sinto a vida, poeticamente.
Divinópolis, 29.02.08