O Mundo É Uma Ponte

Encontro Deus quando penso permitir que ele me encontre.Que tolice. Ele me encontra sempre. O fugido aqui sou eu. De resto, já encontrei Deus na Bahia, e tantas vezes, me parece que ele por lá se diverte. Admiro, e admito possuir um leve vislumbre do que seja o caminho deles, os iogues, os hindus, esses todos que conseguiram fazer desse sacerdócio uma coisa leve, muito poderosa, e que muito se comunica com Deus.

Mas admiro também uma pequena conquista no meu saber sobre a sintonia, sobre os canais que estabelecem esse contato. Quer saber quais são? Aí é que está - não existe fórmula. Acho que o que aborrece o Pai é confiná-lo a uma só faceta. Sou até capaz de vê-lo exclamando “será que me acham assim tão limitado? Será que até hoje, não percebem que meu grande prazer é que enxerguem, com inteligência e sinceridade de alma, a minha multiplicidade?”

Já encontrei com ele no cafezinho e água mineral, um zilhar de vezes. Daí, com os anos, as novidades, as permissões, encontrei-o de forma mais mundana. E noutros anos, com outras novidades no caminho, tive a chance de uma conversa mais afiada com aqueles que tem doutorado sobre o mundo do invisível. E sei lá porque 2 e 2 foram se juntando dentro de mim e foram concluindo que “tudo é muito mais”, mais o coração leve - que é uma dessas expressões que a gente não sabe pôr no papel mas sabe compreender.

Houve ocasiões, por decorrência de ações erradas, que me senti um autêntico e incontestável pedaço de lixo, e mesmo assim transido de nada prazeiroza sensação, encontrei, adivinhe? E palavra que era o mesmo cara de sempre, aquele, sabe, do pôr do sol e do vôo de passarinhos sobre um azul turquesa. Aliás, aquele do céu. Nesse instante não consegui me refrear e exclamei - Mas você também está aqui? E com uns olhos meio serenos, quentes mas indiferentes, ele disse: E por que não haveria de estar? Você acha que é possível negar que o cara que compôs Body and Soul não encontrou com Deus? Você acha que Pixinguinha não tinha aí, um lance com o Cara? Andando por aí me deparei com uma enorme torre onde estava pintado: Aqui se invoca o Deus vivo. E nos canais de tv, donde se trata deste assunto ouvi de relance a frase “Dizer que eu não posso é Dizer que Deus não pode”. Também não me escapou aos olhos, e tampouco poupou-me de reflexões, um grafite em vários postes da cidade, onde a figura de um ofídio engolindo o próprio rabo vinha acompanhada dos dizeres: Deus se come-se.

Sou apenas mais um viajante neste vasto mundo colhendo aqui e ali umas tais informações, e o tema do instante simplesmente apareceu-me, do mesmo jeito que a gente capta um perfume no meio da floresta.

O perfume de Deus. Já meditei. Já rezei aos santos e anjos. Creiam-me: não existe nada mais forte que o poder da oração. Mas algo me diz, Deus está além da oração. Não que esteja fora dela. Mas além. E aquém também. Palavras de Jesus Cristo: Eu sou o amor, a Verdade e a Vida. Ninguém chega ao Pai senão através de mim. E ponto. E mais uma do Mestre: o mundo é uma ponte, atravessa-a, mas não construa casa sobre ela. Acredito nestas palavras como no verde das árvores. E agora me digam: será que só os artistas encontram Deus, ou aquele homem ali, assentando tijolos dia após dia, por anos a fio, também o encontra? Eu digo, na ação dos tijolos, e não quando ele vai à missa aos domingos.

Trecho do livro "Parado no Tempo - Leitura para Maiores de 40 Anos"