O COLIBRI

O COLIBRI

Ao contrário de Augusto dos Anjos, a quem um urubu pousou em sua sorte, na dele, é claro, eu tive a ventura de ver pousado na minha janela - décimo andar – pasmem, um alegre e saltitante beija-flor.

Veio ele com aquele ar travesso e brejeiro que só os colibris têm o dom de possuir e como quem não quer nada, foi-se infiltrando, tomando posse e se instalando na minha janela, perto dos vasos de samambaias.

Saltitava, rodopiava e buscava as flores da minha vida...

Tentei conquistá-lo com um simulacro de flores de plástico recheada de água com açúcar, o único disponível no momento e colou... O bichinho “sorvia” com sofreguidão, o biquinho metido na corola da flor de mentira, ameaçava voar e voltava a “sugar” com volúpia. Olhei-o entre curiosa e feliz.

Saciado, voou para longe, mas logo voltou...

“ Êta agüinha mais gostosa ... Nestes tempos tão difíceis, depois de tentos “planos” bestas, a coisa ta preta, né tia? Já não há flores para se beijar, a poluição está acabando com todas...Ecologia é só propaganda de televisão e conversa mole, prometem tudo e fazem pouco a respeito...

Imagina, o açúcar para adoçar a vida ta custando a hora da morte, é preciso exportar, precisamos de divisas, vai tudo pra fora, né tia? Ninguém mais pode comprar, tudo tão caro... “

Até os colibris, meu Deus, tão pequenininhos e com cabeças que pensam mais que a dos homens...

“Você acredita, tia, que em outra janela do seu edifício, tiveram o desplante de colocar na flor de plástico, destas de mentira que nem a sua, água com adoçante químico pra gente beber? E amostra grátis, ainda por cima...

Vai ser pobre assim lá na Conchinchina. Eu, hein?”

E voou...

Linandre
Enviado por Linandre em 26/02/2008
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