Conquistar marido é para profissionais
No tempo das nossas avós tudo era mais fácil. A prole grande era administrada com o apoio de um séqüito de auxiliares domésticos e a atenção feminina não se dividia entre trabalho e lar. Nas eventuais puladas de cerca do parceiro, a esposa fazia vista grossa. Outras eram as prioridades.
Hoje exige-se exclusividade de contrato. E para ser exclusiva no competitivo mercado amoroso, há que oferecer um produto de excelente qualidade – embalagem e conteúdo – e que exceda francamente as expectativas do cliente. É aí que a porca torce o rabo: com o passar dos anos, o cliente acostuma-se aos bons serviços e fica mais exigente. Ainda se ele fosse se queixar ao Procon...
A conquista inicial tira-se de letra. Difícil é manter ardente a chama de amor às vésperas de completar vinte anos de relacionamento, em meio a filhos, responsabilidades, pequenas crises internas e externas, apontamentos e desapontamentos. Os Beatles compuseram “All you need is love” no auge da juventude. Não sabiam que, com o tempo, love vira commodity. Que o diga Paul, surpreendido aos 64 anos por escandaloso divórcio, situação bem diferente do que ele imaginara ao compor “When I’m 64”. Apegar-se a Deus também não basta, a Assíria do Pelé bem o sabe. E não venha com o papo de beleza interior, inteligência, generosidade, afeto: a rotina embaça virtudes.
Amar é imprescindível, mas é preciso estar sempre em busca da melhoria contínua e inovação. Pessoalmente gosto do exercício da conquista diária. Invisto em alguém que vale o esforço – pelo conjunto da obra. Meu marido é um ser humano admirável, vidas sexual e afetiva vão muito bem, obrigada, nossa família é estruturada. Por isso, continuo adepta das medidas preventivas.
Agora, por exemplo, aproveitei uma viagem de trabalho dele para atacar o quarto de casal. Comecei a extravagância com uma cama americana spring box ( adquirida com recursos próprios, para não correr o risco da relação azedar em lugar de azeitar). E dá-lhe roupa de cama e banho, quadro, objetos de perfumaria e adorno – coisas que, previsivelmente, ele só percebeu após serem apontadas, mas que proporcionam relaxamento e bem estar. Cuidei da varanda, da banheira, reorganizei o closet. Imersa na empreitada há dias, a sensação de que faltava alguma coisa não me abandonava. Então radicalizei: substituí a antiga TV por outra maior, com alta definição de imagens, cobiçada há tempos. Na hora achei que era a cereja sobre o sorvete, o detalhe que faria toda a diferença.
Crasso erro de cálculo, concluí tão logo o percebi em transe hipnótico profundo em frente à tela. Apenas os grandes olhos azuis acompanhando os movimentos da bolinha de tênis denunciavam que ele ainda estava conectado à dimensão terrena. Cuidarei disso assim que conseguir convencer as meninas a voltarem para a sala de TV, agora abandonada às moscas.
Definitivamente exclusividade não é tarefa para amadora.