UMA BALADA PARA BETH CARTER

Beth Carter estava muito triste. Seu médico disse-lhe:

- Você está com câncer.

- Com câncer?!

- Sim, câncer no pâncreas.

Dave Holand estava muito triste e chorou, em seu contrabaixo, vinte e nove noites até que as cordas, molhadas e sombrias só emitiam lamentos.

Beth, agora, cheia de dores e de amores, cantava como um instrumento e os músicos de Beth esforçavam-se para acompanhá-la naquelas magistrais abordagens instrumentais feitas pela sua voz magoada.

Numa noite em que se seguiria uma obscuridade luminar, ela cantou só para mim oito minutos e onze segundos de “ all or nothing at al”. Tentei desesperadamente trazê-la de volta mas só consegui parar o meu calendário num dia frio de 1988.

Daí em diante, andei na companhia de Etta James e Billie Holliday, até que adotei o azul.

Continuo viajando com os blues de Count Basie no bolso do colete e nunca mais usei relógios.

De vez em quando surpreendo-me ouvindo Beth Carter sozinho no escuro.