ENSAIOS DE ILUSÃO

Chega a ser incompreensível como nós seres humanos nos deixamos iludir por coisas que sabemos serem difíceis de conseguir. Nosso coração é um eterno caprichoso que nos torna vulnerável ante as nossas aspirações inconseqüentes que surgem no decorrer de nossa existência. Assim, qualquer sonho provindo de uma noite qualquer, pode tornar-se alguma relíquia de inspiração para que marchemos por uma busca inútil que muitas vezes não conseguimos alcançar jamais, porque nasceu de uma inspiração momentaneamente que se esgota quando acordamos. Mas, lá no fundo há um incentivo indelével que perdura durante o dia fazendo que venhamos a nos perguntar: Será mesmo impossível alcançar aquilo que sonhei?

A busca de um sonho seja no sentido abstrato (vivenciado quando dormimos) ou no sentido real (quando pretendemos alcançar algo no futuro para nosso bem-estar) pode ser perseguido, quando existe para nós uma expectativa concreta através de nossas idéias e do nosso esforço pessoal, mas torna-se uma ilusão quando essa expectativa é abstrata, ou seja, está voltada para um ficção que enxergamos através de um visão estrábica e incoerente, pois os fatos concretos que estamos vivenciando fogem da realidade histórica em razão de exemplos já vivenciados por outras pessoas. Um exemplo clássico é aquela ilusão da adolescência quando achamos que nossa primeira paixão perdurará pelo resto de nossas vidas e quando passam alguns dias, meses ou até anos, tudo desaparece como uma fumaça que se instalou porque pelas redondezas existia o fogo. Como o fogo apaga, o futuro se encarrega de nos mostrar como fomos ingênuos em não perceber que a fumaça vinha do fogo que ao ser apagado também dissipa o encanto.

Algumas vezes temos visões utópicas de algum fato que muito desejamos e até certo ponto temos esperança de concretizá-la e chegamos até lutar por isso, mas logo que começamos a trabalhar com esse objetivo observamos que tudo não passou de uma ilusão, posto que algumas coisas da vida nos mostram um mundo aparente mas não real. Exemplo disso, podemos perceber na política. A eleição do Lula nos mostrou essa faceta. Eu, por exemplo, como sempre fui uma pessoa otimista e por acreditar que o Brasil tem jeito, apostei na eleição do atual Presidente da República, para que fosse formulada uma política social justa, pela qual as pessoas tivessem mais oportunidades na vida e que finalmente pudessem viver num País digno. Foi ilusão e nada disso aconteceu.

Há pessoas que vivem uma vida de ilusão, acreditando em algo que o próprio dia-a-dia se encarrega de mostrar um outro cenário, mas esses seres não querem sair de sua redoma criada pelo sentido figurado de sua concepção e, talvez por temerem a verdade, entram nesse mundo de faz-de-conta, clamando para que um dia sejam contemplados com seu desejo, mas no fundo sabem muito bem que nada daquilo irá se concretizar porque a expectativa depende de muitos fatores com os quais não pode contar, por exemplo, a vontade de que alguém mude de conduta, quando essa pessoa não tem o mesmo propósito. O exemplo comum, são as mulheres que continuam a insistir em manter um casamento enredado por infidelidades do marido, mas persistem em manter as aparências com a esperança que um dia o companheiro mude de conduta, coisa que não acontecerá jamais se o próprio gerador da expectativa não tiver a mesma intenção.

O fato é que muitas pessoas cansam de viver iludidas - como diz uma certa música de Roberto Carlos - e aí têm de dar uma reviravolta na sua vida. É deveras um passo muito difícil de ser dado, mas necessário, quando a ilusão está gerando infelicidade.

No entanto, a ilusão faz parte da vida. Acredito que não exista sobre a terra uma só pessoa que um dia não se iludiu com algum fato ou com algum ato ou conduta de alguém. Isso é normal e humano, pois ninguém possui bola de cristal para prever o futuro ou para adentrar no íntimo de outra pessoa e avaliar com objetividade suas intenções. O ideal seria que cada de um de nós fosse o mais autêntico possível e todas as condutas do ser humano fossem voltadas para o bem, mas sabemos que isso também encerra mais uma ilusão ou uma utopia.

Enfim, o ser humano tem de viver com essas incógnitas que permeiam sua existência, por isso deve haver regra de conduta para cada um de nós no sentido de estabelecermos um princípio de defesa, confiando nas pessoas com certa reserva, cuja realidade só é palpável no que diz respeito à sua utilização com pessoas de fora de nosso convívio, pois quanto aos seres que amamos e respeitamos dentro do nosso lar ou de nossa família, não pode haver regra ou restrições, sob pena de rompermos o elo mais sagrado da convivência que é confiança recíproca. Se um dia isso se rompe, não cabe a nós pessoas corretas respondermos pelos atos de quem não corresponde à nossa confiança, já que caráter e lealdade é um dom que não se comunica com as pessoas que desprezam as boas relações humanas.

O fato é que a ilusão é um disfarce do sonho. No fundo da alma as pessoas almejam coisas boas para si mesmo. Assim, quando se iludem com algo que para si próprio é uma realidade, estão na verdade dando alento a um sonho. Destarte, a ilusão é a materialização do sonho, mas ambos vivem no abstrativismo da pessoa, já que essa dose dupla de aspiração alimenta a própria esperança. O importante nisso tudo, é que cada um saiba como lidar com isso e não se deixe levar pelos dissabores da ilusão, sabendo como superar os traumas quando tiver ciência de que seu desejo não vai se realizar.

Em todo caso a ilusão é algo bom na medida em que preenche uma lacuna na vida da pessoa por determinado tempo. O ruim é quando ela se prorroga por muito tempo, pois a pessoa deixa nesse grande intervalo de tempo de viver uma realidade palpável que poderia ser muito mais proveitosa como essência de vida, já que a pessoa iludida não parte para outro horizonte e fica inerte esperando acontecer algo que nunca chegará. Conhecendo esses dois parâmetros da ilusão, saberemos ligar com esse subjetivismo de uma forma mais eficaz, fazendo chegar às pessoas iludidas uma dose de compreensão e de ajuda até que estas possam enxergar com olhos reais a existência de uma ficção e não de uma realidade.

Machadinho
Enviado por Machadinho em 21/02/2008
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