O CASAL DA GROTA

Zeca e Rita formavam o casal mais curioso, lá das bandas do grotão. Não havia festa a que os dois não comparecessem. Uns verdadeiros pés-de-valsa. Também nos velórios tomavam a frente e, eram pau-pra-toda-obra.

Por ocasião das festas religiosas em Marilândia, no município de Itapecerica, era Zeca quem ia, de casa em casa, lembrar a importância das datas. Sua alegria era ver a igreja cheia de fiéis. E não dava outra: era o casal mais popular daquelas imediações. O povo foi-se acomodando em sua preguiça, assim, Zeca e Rita passaram a ser imprescindíveis naquele pequeno lugar.

O título dessa história faz jus à realidade, pois moravam realmente numa grota, quase que proscritos, longe do conforto das casas, que rodeavam a praça principal.

Os filhos eram uma conta fechada: doze. Isso mesmo, uma dúzia, um bando de gente que, reunida, parecia alguns terem a mesma idade, uma miuçalha, como se dizia naquele lugar.

Desde muito pequenos, trabalhavam. Os mais resistentes, na enxada, tirando eito; os menos, no trato dos animais domésticos, como galinhas e um porquinho, presente do compadre, ao afilhado, o caçula. As meninas, nos afazeres domésticos. O casal, em regime de economia familiar, labutava em terras alheias, escassas e pouco produtivas, que nunca lhes garantiam fartura de alimentos.

Aproximando-se as festas, a casa dessa família se movimentava. Todos gostavam de participar, de fio a pavio. Rita escolhia na venda uma chita (eram poucas as opções), muitos metros, para uniformizar todo o pelotão. Eram camisas para uns, vestidos para outras e todos se sentiam prontos para o sucesso no arraial. Na maioria das vezes, comprava outro pano, no mesmo padrão, mas de cor diferente e sofisticava o figurino.

Para economizar os sapatos, iam de chinelo até o início da aldeia, quando colocavam o calçado “de ver Deus”, e punham o velho no bornal, cujas tiras atravessavam o peito. O local escolhido para as mudas, era um cruzeiro enorme de madeira gasta, onde passarinhos descansavam e rosas de papel colorido abraçavam a fé daquele povo.

Tive notícia dessa gente e conheci seus costumes, através de uma prima, contemporânea deles; achei interessante e quis saber como estão vivendo hoje, passados quarenta longos anos. Informou-me que não tem notícia de todos.

É certo que o casal não existe mais, alguns dos filhos têm casas boas, uma vida melhor do que seus pais tiveram. Outros, se mudaram para uma cidade maior e até estudaram. As moças se casaram e, os que permaneceram no lugar, mantiveram a tradição dos progenitores, de organizar e participar das festas, com a alegria daqueles que apreciam a vida.

No coração e na memória de todos, a lembrança do carinho da mãe, escolhendo as chitas, floridas lembranças: verdes, rosas, azuis e amarelas. Também um cruzeiro cheio de flores e pássaros que, valentemente, se mantêm no mesmo lugar, testemunhas da simplicidade e da harmonia que existiam na vida daquela família da grota.

fim

DORA TAVARES