GRAXA SEM GRAÇA

Corria o ano de mil novecentos e setenta e cinco.

Eu estava há alguns dias sem engraxar sapatos,

E sem dinheiro.

Peguei a caixa de engraxate e a cadeira,

E fui para o ponto de ônibus.

Era um posto de ônibus com cobertura ampla,

onde faziam final os ônibus da linha Ipatinga-Cel. Fabriciano.

Era bom engraxar ali!

Eu tinha as escovas de lustrar,

Água com sabão para limpar,

Uma escova de dentes velha para aplicar a água com sabão.

Tinha um pedacinho de espuma, já duro, sujo de graxa;

Um pano para o retoque e uma latinha de graxa vazia!

- “ei moço, vão engraxar o sapato?”

O moço assentiu.

Senti um calafrio!...

Será que é um freguês enjoado? Pensei...

Outro calafrio!

Dei sorte ,

O moço era um fleumático e pôs-se a olhar os transeuntes.

Que alívio!!!

Limpei beeem os sapatos com a escova!

Ensaboei-os com esmero e pressa.

Eles não podiam umedecer!

Encaixei a latinha de graxa na mão esquerda, emborcada.

Simulei engraxar como se nada estivesse acontecendo!

Meu freguês continuava olhando os passantes...

Eu sentia calafrio após calafrio!

Escovei como nunca o sapato para que pegasse algum brilho!

Passei o pano de lustrar.

Dei uma conferida.

O sapato estava assim, meio que meio...

- moço, está pronto.

Ele pagou, nada disse e foi-se embora.

Fui ao supermercado e comprei

Uma latinha de graxa

“novinha em folha”.

Ufa!!!

Nunca mais deixei faltar graxa!