Na toca com Alice

De Edson Gonçalves Ferreira

Para Maria José Santos Guimarães e Rute Gomes dos Santos

e para Maria Celeste de Oliveira Teixeira

Eu sei que não sou Alice, nem Lewis Carroll... Estou, contudo, todos os dias, entrando e saindo da toca do Coelho Maluco. Quanta gente bebe chá, hoje, em uma xícara quebrada e não vê nada de anormal nisso. Olhemos para Brasília. Lá, todos os dias, os graúdos fazem coisas mais impensáveis que a Rainha de Copas. Cortem a cabeça deles, cortem a cabeça deles. Fico imaginando quantos jovens nunca ouviram falar de Lewis Carroll e, talvez, nunca leram “Alice no país das maravilhas”. E o Brasil, minha gente, não é chamado de país maravilhoso? Somos todos coelhos malucos.

Hoje, é domingo, estou relaxando, mas meu cérebro não pára, não pára. Meu relógio saiu do livro de Alice. Estou sempre apressado, afobado. Nunca vi um brasileiro que não fosse afobado. Também com tanto imposto e taxas para pagar!... A rainha maluca e sua escolta com a quilhotina pronta. Depois, falam que estamos vivendo numa democracia. É claro que para falar as coisas que a gente quer estamos. Quando se fala, contudo, em liberdade real, não.

Nem as escolas, infelizmente, libertam mais. Quantos jovens são formados todos os anos e não arrumam emprego? Gostaria que os jovens lessem mais para saberem reagir com presteza e prudência. Afinal, em Brasília tem mais narcisistas que, se Oscar Wilde fosse vivo, escreveria não o “O retrato de Dorian Gray”, mas “O retrato dos políticos narcisistas”.

Sim, porque eles só enxergam a sua realidade. Acredito que alguém, ao ler esta crônica, vai dizer: _ O Edson não descansa nem no domingo? Estou descansando, gente, mas não posso deixar de escrever. As palavras são para mim flores e armas. Assim, hoje, estou jogando algumas palavras como sementes, ao redor da toca de Alice. Quem sabe se alguém, por ventura, sair dali, se depara com um canteiro de flores e, ao sentir o perfume delas, pense no real sentido da vida.

Tem gente que pensa que estamos aqui só para nos multiplicar. Quem tem filhos é, com certeza, corajoso. Ter filhos é compromisso para toda a vida. Ninguém deixa de ser pai nem mãe. Mas quem é solteiro como eu também tem esse tipo de compromisso, já que não encaro a vida de forma descompromissada. Meus irmãos e irmãs, meus sobrinhos, meus primos, meus amigos são minha família. Um compromisso também para o sempre. E como não aceito qualquer coisa, cobro de todo mundo. Pareço-me muito com a Alice, com o Coelho Maluco, com a Emília de Monteiro Lobato e, principalmente, com Dom Quixote.

Assim, quando ligo a televisão, dou mais palpites que a Emília. Nos lugares em que trabalho, fico observando as pessoas. Recentemente, descobri que um ex-aluno meu não merece mais nem um bom dia meu. Vendeu a alma pra uma diaba. Felizmente, foi só um aluno. Graças a Deus que não ganhei um beijo nas faces dele como Judas fez com Jesus. Sim, porque não sou Filho de Deus, eu reagiria, violentamente. Às vezes, tenho dó de mim! Não sintam peninha, porque xingarei, não sou nenhum coitadinho. Tenho uma leitura de mundo ótima e quero que meus alunos a tenham também.

Encerrando esta crônica, minha gente, vamos apelar para que a moçada conheça os grandes autores. Hoje, infelizmente, quando se fala em Oscar Wilde, em Lewis Carroll, em Castro Alves, em Guimarães Rosa, em Fernando Pessoa, muita gente acha que estamos falando de et´s. Quando vou dar aula, sempre pergunto que tem o hábito de ler, poucos levantam a mão. Se continuar assim, as escolas continuarão como estão, que horror! Cuidado, a Rainha de Copas e a Dama-de-negro estão soltas...

Divinópolis, 17.02.08

edson gonçalves ferreira
Enviado por edson gonçalves ferreira em 17/02/2008
Reeditado em 20/02/2008
Código do texto: T863618
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