Dias de festa
DIAS DE FESTA
(crônica publicada no jornal "Diário Catarinense" de 13.02.2008)
No dia 11 de dezembro ocorreu uma batalha que definiu o destino do confronto. Foi exatamente a batalha que decidiu a guerra. Eram, ao todo, 18.900 brasileiros contra 4.700 paraguaios. De um lado, sob o comando do então Marquês de Caxias e do General Manuel Luís Osório (na refrega, o parente mais ilustre de Manoel Osório foi atingido no rosto por um tiro), havia 26 canhões e 3 mil cavalos. Do outro, com o General Bernardino Caballero, foram 12 canhões a fumegar. Ao final do embate, o Brasil contabilizou 1.728 baixas com 297 mortos. Do Paraguai, saíram vivos 200 homens, que conseguiram fugir. As mulheres que seguiam seus maridos, filhos e pais não foram poupadas pelos vencedores: "perseguidas através do campo de batalha, arrojadas ao solo entre os cadáveres, violadas na lama. A festa durou até muito tarde", nos contam Manlio Cancogni e Ivan Boris em "El Napoleón del Plata".
O ano era 1868 e esse que foi o maior e mais sangrento conflito armado internacional já ocorrido nas Américas é conhecido no Brasil como Guerra do Paraguai, na Argentina e no Uruguai como Guerra da Tríplice Aliança e, no Paraguai, como Grande Guerra. A batalha que deu rumo à guerra aconteceu às margens do "torrente Avahý", ou arroio Avaí, "uma corrente de água muito rápida e impetuosa". Avahý, que para os guaranis significa Rio do Índio.
O episódio da Batalha do Avaí, lido no livro "História do Brasil", de Rocha Pombo, inspirou o nome do time de futebol que se fundava na Ilha de Santa Catarina em 1o. de setembro de 1923 e que por pouco não foi batizado como Independência. O uniforme de camisetas com listas verticais azuis e brancas, calções e meias azuis, foi copiado do Riachuelo, um clube de remo de Florianópolis, uma paixão local - e também uma batalha, esta fluvial, da Guerra do Paraguai. O primeiro rival do Avahy Football Club, derrotado duas vezes seguidas já na estréia da nova equipe, foi o Humaitá, nome de outra batalha da mesma guerra.
Neste ano do seu 85o. aniversário, o Avaí conseguiu se planejar, fazer as contratações corretas, promover aos poucos os destaques das chamadas "categorias de base", treinar com tempo e condições, e se preparar de tal forma que começou o campeonato estadual já de forma arrasadora: mesmo perdendo por 3 a 0 o clássico de domingo para o Figueirense (nome que não tem nada a ver com o Paraguai), o time continua com o ataque mais eficiente do torneio - 23 gols em 7 partidas, ou mais de 3 gols, em média, por jogo -, a defesa menos vazada - 7 gols apenas, o que dá um gol por partida -, o artilheiro do certame - Vandinho, com 9 tentos - e o segundo lugar isolado, somente 3 pontos atrás do Criciúma, que tem uma partida a mais que o Avaí. Na partida que falta, que se realizará justo na noite de hoje, essa equipe "muito rápida e impetuosa" tem tudo para tirar a diferença e assumir a ponta superior da tabela devido ao impressionante saldo de gols: 16 contra 10 do líder momentâneo.
Está claro que essa equipe é a melhor que o clube conseguiu montar nos últimos dez anos. Está claro que essa equipe atua afinadíssima, com padrão de jogo, alternativas de ataque, muita técnica, muita garra e muito entusiasmo. Está claro que essa equipe é, hoje, a melhor do Estado e está pronta para ir muito longe nos próximos meses.
Dia de jogo do Avaí é dia de festa para a sua enorme torcida, dia de tantos gols que nem se consegue lembrar direito deles todos. Quando o Avaí não ganha, o que é muito raro, a torcida adversária faz festa - mas não pela qualidade do seu time, e sim pelo inesperado de conseguir segurar um time quase imbatível. Como aconteceu no domingo.
(Amilcar Neves é escritor e autor, entre outros, do livro "O Tempo de Eduardo Dias - Tragédia em 4 tempos", teatro)