POETA HERMES FONTES
HERMES FONTES
Nelson Marzullo Tangerini
Era costume o professor Nestor Tangerini e o Dr. Maurício Marzullo, seu cunhado, trocarem correspondência e enviarem sonetos um para o outro.
Infelizmente, toda a correspondência entre os dois poetas acabou se perdendo em 1966, quando um forte temporal castigou toda a cidade do Rio de Janeiro: a maior catástrofe na história da Cidade Maravilhosa.
Tínhamos um quarto nos fundos de nossa casa, no quintal, onde guardávamos toda a obra de nosso pai. A chuva, que parecia ser interminável; um dilúvio, portanto, invadiu este quarto e transformou muitos papéis de Nestor Tangerini em verdadeiro lamaçal.
Dizia Dinah Marzullo Tangerini, minha mãe, que “muita coisa se perdeu naquele temporal.” Perdemos esquetes, crônicas, sonetos, trovas, partituras, cartas e caricaturas.
O cronista que vos escreve tinha 9 anos, nessa época. Estava na casa de meus tios, Maurício Marzullo e Netinha, num momento muito difícil: Nestor Tangerini se despedia de nós. Morreria no dia 30 de janeiro de 1966, após longa batalha contra o câncer.
Era difícil, portanto, nos dividir entre Nestor Tangerini e sua obra. Não tínhamos cabeça para tal. Estávamos exaustos e muito abalados.
Mais tarde, em 1999, remexendo o que sobrou, para elaborar o meu livro Perfil quase perdido – Uma biografia para Nestor Tangerini, consegui salvar uma das cartas de Tangerini a Marzullo; uma delas, fazendo observações sobre o soneto Amor Perfeito, do poeta sergipano Hermes Fontes:
“Maurício:
Belo soneto de Hermes Fontes, no qual, como em outros trabalhos seus, se vê o grande artista que foi do verso.
Não abusara o poeta do indefinido e não houvesse repetido a expressão tal qual, seu Amor-Perfeito seria um amor, perfeito?
Eis como entendo devê-lo-ia ter escrito:
O amor perfeito, flor modesta e original,
Miniatura em cetim, de volátil painel,
É, comparando bem, ou comparando mal,
Um pedacinho da alma irial de Rafael.
Para os que amam, o amor perfeito é a flor ideal
Um beijo de veludo embebido de mel...
Simples modo de ver: outros o acham tal qual
Bela e fina medalha exposta em cópia fiel.
Dentro em nós há um amor perfeito de ouro e anil,
Com bordados de luar e esmalte de arrebol,
Sob o pólen de luz do céu primaveril...
Põe-no triste a Saudade; o Amor põe-no taful:
E ele refulge em nosso espírito de escol,
Bem qual, no seu dossel de abril, o sol no azul”.
Para que o leitor leia o texto como fora escrito, inicialmente, publicamos o belo soneto parnasiano de Hermes Fontes:
“AMOR-PERFEITO
O “amor-perfeito”, flor modesta e original,
miniatura em cetim de um volátil painel,
é, comparando bem, ou comparando mal,
um pedacinho da alma irial de Rafael.
Para os que amam, o “amor-perfeito” é a flor ideal
um beijo de veludo embebido de mel...
Simples modo de ver: outros o acham tal qual
uma fina medalha exposta em cópia fiel.
Dentro em nós há um “amor-perfeito” de ouro e anil,
com bordados de luar e esmaltes de arrebol,
sob o pólen de luz de um céu primaveril...
Põe-no triste a Saudade; o Amor põe-no taful:
e ele refulge, em nosso espírito de escol,
tal qual, no seu dossel de abril, o sol no azul...”
Hermes Floro Bartolomeu Martins de Araújo Fontes, Bacharel em Direito, poeta e compositor, nasceu a 28 de agosto de 1888, em Boquim, Sergipe, e faleceu a 25 de dezembro de 1930, no Rio de Janeiro.
Nelson Marzullo Tangerini, 52 anos, é escritor, compositor, jornalista, fotógrafo de professor de Língua Portuguesa e Literatura. É membro do Clube dos Escritores Piracicaba, onde ocupa a Cadeira 073 Nestor Tangerini.
n.tangerini@uol.com.br, tangerini@oi.com.br