SOFRIMENTO

“O sofrimento é tanto que a gente acaba se acostumando”. A frase foi dita por uma mulher de Alagoas, que teve onze filhos ao longo da vida, sendo que três morreram quando ainda crianças. Isso foi no dia 22 de janeiro de 2008, quando a imprensa anunciou que a mortalidade infantil em nosso país havia diminuído significativamente em relação ao último levantamento, realizado no ano de 1996, mas ainda considerado um índice muito elevado. Não vou me ater a números pois o que interessa aqui não é a quantidade, mas sim a qualidade de vida que este país “oferece” a uma boa parte de seus filhos.

O sofrimento que essa gente carrega dentro de si é impossível de ser mensurado, de ser avaliado por quem quer que seja. São tantas as tragédias anunciadas (a seca, as inundações, o caos completo na saúde, as drogas, a violência urbana) que as pessoas vão indo num crescendo tão rápido em direção ao nada, e quando se dão conta não lhes resta nem viver com dignidade.

2008 mal começou e já podia terminar, visto a quantidade de tragédias e desgraças que já aconteceram em tão pouco tempo de vida deste ano, dito novo.

No ano passado, a maior tragédia no mês de janeiro foi a cratera na linha amarela do metrô de São Paulo, ocorrida no dia 12, uma sexta-feira de muita chuva. Mortos e desabrigados em mais uma ocorrência em que o descaso pelo ser humano se faz presente até os dias de hoje. A televisão nos mostra a saga de alguns moradores que foram desalojados de suas casas e até hoje ainda moram em hotéis. E de outros que já conseguiram acordo com a construtora e providenciam a mudança para o novo endereço. Mas o que ficou para trás, o que foi perdido para sempre e a alegria de viver jamais serão recompensados pelo que quer que seja. As marcas da tristeza estampadas no rosto das pessoas não deixam margem a dúvidas.

Vítimas da seca e das enchentes são mostradas sem cerimônia nos noticiários da televisão, sem água, sem comida, sem dignidade, sem amor e com a barriga grande pelos vermes. A mortalidade infantil a comprovar a desgraça deste país (mas o governo comemora a redução dos índices), os mais velhos com expressões sem expressão, vazios, sem sonho algum, totalmente ocos internamente. Percebe-se no seu falar a falta de qualquer tipo de sentimento que não seja o sofrer calado, conformado e, em alguns casos, sofrer com um pouco de esperança que alguns ainda conseguem carregar dentro de si.

Várias enchentes já castigaram e aterrorizaram diversas regiões do país neste início de “ano novo”, geralmente nos mesmos lugares dos anos anteriores sem que seja tomada a menor providência pelas “autoridades”. E as falas são sempre as mesmas. “Perdi tudo que tinha, agora só resta começar tudo de novo!”. E o tom de voz, o olhar, os gestos não possuem a menor expressão. Fala-se por falar, sem saber até o que se está falando.

É desumano o que muitos passam nessa vida. Uma vida que não lhes traz nada de bom, por mais que tentem, por mais que procurem, por mais que se aviltem. Com o passar do tempo, com o acúmulo de tantas desgraças e de tanta coisa ruim, acostumam-se à vida que levam, aceitando os fatos passivamente, acreditando até que Deus é o único responsável por tudo aquilo que sofrem.

Deus tem as costas largas. Pode reparar que inúmeras coisas no mundo são feitas “em nome de Deus” ou “pela vontade de Deus”. Sem polemizar o assunto, permito-me dizer que não enxergo assim. Apesar de Ele mostrar-se como o ser maior do Universo, fica difícil lutar sozinho contra tantas quadrilhas de políticos bandidos e ladrões, contra tantos extremistas que matam em nome d’Ele e contra tanta gente partidária do “quanto pior, melhor”.

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Arnaldo Agria Huss
Enviado por Arnaldo Agria Huss em 11/02/2008
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