A Basílica de São Pedro e a Capela de São Vicente
“Pedro, tu és pedra, e sobre esta pedra edificarei minha Igreja.”
Roma suscita uma espécie de viagem pela própria história: a cidade do grande Império Romano, dos tempos antigos; as ruínas do Coliseu e do Fórum Romano; as fontes, os pórticos e as colunas; as obras de Michelangelo e de Leonardo da Vinci; o Vaticano... O Vaticano é um país — o menor do mundo em território, é verdade —, mas esse pequeno Estado é sempre um tesouro surpreendente.
A praça de São Pedro encanta pelo conjunto arquitetônico. E quando adentramos a Basílica, causam alumbramento as dezenas de esculturas e pinturas renascentistas. Eu já tinha tido oportunidade de visitá-la durante o dia, mas, ao chegarmos para a Missa do Galo, causou-me impacto o efeito da iluminação. Creio mesmo que a beleza dos adornos dourados do teto quadruplica-se.
Os católicos sabemos que a celebração eucarística da noite de Natal é conhecida como Missa do Galo, numa referência à fábula que afirma ter sido esse animal o primeiro a presenciar o nascimento de Jesus, ficando encarregado de anunciá-lo ao mundo. Não carece mencionar a importância de que se reveste a referida cerimônia religiosa.
Quando comecei a responder algumas coisas com meu precário latim, Alice e Vilani olharam-me meio espantadas, como se estivessem a indagar onde eu teria aprendido aquela língua. Além de ter sido, por um semestre, aluno do professor Josafá Inácio da Costa, ainda trago bem presente, de minha infância, como entoavam a ladainha de Nossa Senhora e outros cânticos, em latim, um grupo de senhoras lá na capela de São Vicente, formado, dentre outras, por Aldeíza Sena, Vanda Gondim, Lourdes Ferreira e Dedé Almeida.
E como também era costumeira a nossa participação nas missas natalinas no histórico templo mossoroense, foi inevitável, naquele momento, emergirem algumas comparações entre a celebração na Basílica de São Pedro com as ministradas em nossa capela vicentina. ‘Descabidas’, dirão alguns. Bem, sejam ou não cabíveis, as emulações borbulhavam. Desde o momento da chegada do Santo Padre, conduzido na belíssima procissão vestibular, lembrei-me imediatamente de como era a entrada de padre Sátiro Dantas, por vezes, acolitada pelo meu padrinho Chico Honório, Jaci Gurgel e por mim. E, por mais que pareçam, as comparações não emergiam cingidas pelo velho maniqueísmo questionador que costumamos estabelecer entre a riqueza de algumas catedrais e a singeleza de muitas capelas. Não. Naquele momento o que mais me impressionava era constatar que a Igreja Católica, com sua história milenar, em meio a doutrinas e lendas, segue viva, dinâmica em seu tempo, se fazendo presente de muitas formas em vários recantos do mundo.
Mas, voltando à missa, a nós, leigos, torna-se impossível observar e comentar todos os detalhes litúrgicos; porém, não poderíamos deixar de realçar a extraordinária atuação harmônica do coro pontificial da Capela Sistina. Aliás, todo o ritual encanta. Na missa, prevalecem o italiano e o latim, e, em determinadas ocasiões, como nas leituras bíblicas e nas orações dos fiéis, outras línguas se destacam. Foi muito bom ouvir a nossa “Última flor do Lácio, inculta e bela”, figurando galhardamente.
No dia seguinte, almoçando com os seminaristas Frederico Gurgel e Charles Freitas, originários de nossa Diocese de Santa Luzia, que atualmente estudam na Itália, aproveitei para tirar algumas dúvidas. Pois, em geral, causa-me espécie algumas semelhanças entre as vestes do Papa e as dos padres. Eles explicaram que os paramentos presbiterais são realmente similares. O que difere são as chamadas insígnias pontificias e episcopais, pois não podemos olvidar que o Papa é também o Bispo de Roma.
Outro detalhe que não escapou aos meus olhos atentos foi quando o Santo Padre passava bem próximo ao local onde estávamos, e, saindo um pouco do protocolo, de forma simpática e espontânea, abraçou festivamente uma senhora, que, pelo gesto de espanto por ele mesmo esboçado, parecia ser-lhe uma velha conhecida.
Já passava das duas horas da fria madrugada quando descemos os degraus molhados da Basílica, em busca de um táxi, e meu pensamento ainda estava naquela mulher que, na noite majestosa, terminou por revelar um pouco do lado humano do Sumo Pontífice, materializando um velho ensinamento de que a Igreja e seus pastores são santos e pecadores, sendo, assim, divinos e humanos.