A CRIATURA E O CRIADOR
O poeta Ulisses Barroso é um contador de estórias nato. São muitas as estórias existentes no repertório dele envolvendo a Criatura humana e o seu Criador.
Numa de suas visitas ao Colégio São Sebastião do Belo Monte, em Agraciados do Brasil, a convite do professor da cadeira de Literatura Brasileira, ele contou uma que chamou muito a atenção de todos ali presentes.
Segundo o entendimento dele, esta estória retrata muito bem a preocupação do homem que encara a luta pelo poder como uma meta a ser atingida a qualquer preço, independentemente de quem ele possa prejudicar com seus atos e ações e assim se expressou:
"Certo dia, um homem preocupado com o povo que ele o representava política e socialmente, questionou o Criador acerca do seu curto e indefinido período de permanência cá no plano terrestre. Ali, num tom de súplica, ele quis saber se o Criador não daria um jeito de torná-lo eterno e imune a qualquer tipo de enfermidade e/ou problemas que lhe roubassem a paz e sua tranqüilidade de espírito durante a sua existência de modo que ele tivesse como cuidar mais e melhor de sua gente.
O poeta Ulisses Barroso disse ainda que o Criador ficou bastante curioso com a complexidade do pedido feito pela Criatura. Não era normal aquele tipo de preocupação partindo de um homem dotado de tantos poderes políticos e sociais, envolvendo os seus subalternos e no intuito de atender melhor o desejo de Sua Criatura, pôs-se a pensar no que fazer e chegou a uma feliz conclusão, externando-a em forma de compromissos e condições de execução, conforme segue:
Disse o Criador:
- Tornar-lhe-ei um ser eterno, imune a qualquer tipo de enfermidade e dotar-lhe-ei de muito poder, bem como pouparei seu povo de todos os tipos de preocupações e/ou problemas relativos à falta de infra-estrutura e elementos sociais básicos, tais como alimentação, educação, saúde, transporte e segurança... mas em compensação eu lhe transformarei em um escravo do poder econômico e político do país onde você estiver vivendo, obrigando-lhe apenas e tão-somente a fazer um acompanhamento sistemático de todas as mazelas sociais a que este seu povo estiver submetido.
- Tornar-lhe-ei um ser dotado de inteligência, capaz de produzir em laboratórios bastantes recursos imunológicos que possam ser usados em prol da preservação de sua espécie... mas em compensação, eu também o dotarei de inteligência suficiente para a confecção de bombas de hidrogênio e outros artefatos bélicos eficazes, capazes de exterminar de forma indiscriminada os seus semelhantes. Outrossim, permitirei, que após o uso desses recursos infalíveis, sejam usadas as mais variadas desculpas, inclusive a de que tal medida fora extremamente necessária por tratar-se de medidas adotadas em momentos e/ou estado de força maior.
- Tornar-lhe-ei um ser obediente aos meus ensinamentos, sobretudo no tocante à maneira mais simples de viver em perfeita comunhão com os seus semelhantes, ajudando-os solidariamente, assim como desobrigando-lhe do uso de qualquer tipo de discriminação social, em compensação eu manterei sob meu controle, por tempo indeterminado, a manipulação do bem e do mal e de toda organização política, seja ela partidária ou não, tão largamente usada por alguns seres humanos contemporâneos, sob pena da extinção da espécie mais privilegiada existente sobre a face da Terra.
A Criatura ouviu atentamente toda a preleção do Criador e demonstrando sinais de preocupação, achou que seria impossível o cumprimento de todas aquelas exigências. Preocupou-se, sobremaneira, com as condições do acordo que estava sendo firmado, mas ao mesmo tempo ele se achava no dever de fazer algo em prol de seu povo e para não ficar em dívida com a sua consciência, disse ao Criador:
- Meu Pai, eu acho que não é preciso mudar nada não, pois o meu povo está vivendo muito bem. Deixemos tudo como está e, em vez de eu ter que cumprir tudo isso, apenas me conceda alguns anos a mais de vida e um pouco mais de poder, a fim de que eu possa permanecer no ápice do cargo político que ora me encontro e, assim, conseguir galgar outros daqui para frente.
- Da mesma forma, se não for Lhe pedir muito, me permita que eu mantenha pelo menos algumas daquelas contas bancárias que tenho no paraíso fiscal das Ilhas Caimãs, ou simplesmente aquelas poucas que ora mantenho na Suíça.
O Criador lhe respondeu:
- Tudo bem meu filho, nosso acordo está fechado, mas antes disso eu vou sugerir para o Congresso Nacional de seu país instaurar mais uma Comissão Parlamentar de Inquérito, visando à apuração desse desvio de valores para outros países.
A Criatura, preocupada com a possibilidade da perda do poder, Lhe respondeu:
- Meu Pai, eu reconheço que esse assunto é mesmo muito complexo, portanto, esqueçamos o pedido que fiz e cancele a proposição da instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito sugerida, pois eu tenho certeza que meu povo continuará com a Vossa ajuda, independentemente de eu ter que fazer ou não algo em benefício dele. De uma forma mais que insistente, a Criatura procurou seguir os passos do Criador que se afastava lentamente daquele local e, segurando nas Suas vestes, fez mais um pedido:
- Meu Pai, independente de eu poder continuar ou não representando bem o meu povo sofrido, pois sinto que essa é uma tarefa muito árdua para os governantes em geral nos dias atuais, eu poderei continuar mantendo as minhas contas bancárias no estrangeiro, a partir de agora?
O Criador, sem nenhuma parcimônia, assim lhe respondeu:
- Meu filho, é fato público e notório que ao longo de todo esse tempo em que a grande maioria dos representantes de governo das Criaturas, que tem tentado liderar seu povo e que se achado no direito de representá-lo política e socialmente, tem uma grande certeza: todo o povo tem o governante que merece, e o seu povo não será uma exceção. Portanto, não se aflija meu filho, faça aquilo que a sua consciência pedir para realizar aqui no plano terrestre. Não se preocupe com as necessidades do seu semelhante, portanto, gaste toda a verba do erário, da forma que você bem entender, pois o seu acerto de conta comigo já está bem próximo.
A Criatura, meio desolada, sobretudo preocupada com aquela situação, e sem saber o que fazer com tanto dinheiro, disse para o Criador:
- Está certo, meu Pai. Eu sei que de acordo com o Vosso entendimento a minha permanência aqui na Terra está por um fio, desta forma, eu não terei outra saída senão gastar com o “meu pessoal” todo o dinheiro que mantenho guardado lá no estrangeiro. Amanhã mesmo viajarei com minha esposa e meus quatro filhos para o Caribe e, em estando lá, após algumas semanas de raro lazer, estarei à Vossa disposição..."
O poeta Ulisses Barroso é um contador de estórias nato. São muitas as estórias existentes no repertório dele envolvendo a Criatura humana e o seu Criador.
Numa de suas visitas ao Colégio São Sebastião do Belo Monte, em Agraciados do Brasil, a convite do professor da cadeira de Literatura Brasileira, ele contou uma que chamou muito a atenção de todos ali presentes.
Segundo o entendimento dele, esta estória retrata muito bem a preocupação do homem que encara a luta pelo poder como uma meta a ser atingida a qualquer preço, independentemente de quem ele possa prejudicar com seus atos e ações e assim se expressou:
"Certo dia, um homem preocupado com o povo que ele o representava política e socialmente, questionou o Criador acerca do seu curto e indefinido período de permanência cá no plano terrestre. Ali, num tom de súplica, ele quis saber se o Criador não daria um jeito de torná-lo eterno e imune a qualquer tipo de enfermidade e/ou problemas que lhe roubassem a paz e sua tranqüilidade de espírito durante a sua existência de modo que ele tivesse como cuidar mais e melhor de sua gente.
O poeta Ulisses Barroso disse ainda que o Criador ficou bastante curioso com a complexidade do pedido feito pela Criatura. Não era normal aquele tipo de preocupação partindo de um homem dotado de tantos poderes políticos e sociais, envolvendo os seus subalternos e no intuito de atender melhor o desejo de Sua Criatura, pôs-se a pensar no que fazer e chegou a uma feliz conclusão, externando-a em forma de compromissos e condições de execução, conforme segue:
Disse o Criador:
- Tornar-lhe-ei um ser eterno, imune a qualquer tipo de enfermidade e dotar-lhe-ei de muito poder, bem como pouparei seu povo de todos os tipos de preocupações e/ou problemas relativos à falta de infra-estrutura e elementos sociais básicos, tais como alimentação, educação, saúde, transporte e segurança... mas em compensação eu lhe transformarei em um escravo do poder econômico e político do país onde você estiver vivendo, obrigando-lhe apenas e tão-somente a fazer um acompanhamento sistemático de todas as mazelas sociais a que este seu povo estiver submetido.
- Tornar-lhe-ei um ser dotado de inteligência, capaz de produzir em laboratórios bastantes recursos imunológicos que possam ser usados em prol da preservação de sua espécie... mas em compensação, eu também o dotarei de inteligência suficiente para a confecção de bombas de hidrogênio e outros artefatos bélicos eficazes, capazes de exterminar de forma indiscriminada os seus semelhantes. Outrossim, permitirei, que após o uso desses recursos infalíveis, sejam usadas as mais variadas desculpas, inclusive a de que tal medida fora extremamente necessária por tratar-se de medidas adotadas em momentos e/ou estado de força maior.
- Tornar-lhe-ei um ser obediente aos meus ensinamentos, sobretudo no tocante à maneira mais simples de viver em perfeita comunhão com os seus semelhantes, ajudando-os solidariamente, assim como desobrigando-lhe do uso de qualquer tipo de discriminação social, em compensação eu manterei sob meu controle, por tempo indeterminado, a manipulação do bem e do mal e de toda organização política, seja ela partidária ou não, tão largamente usada por alguns seres humanos contemporâneos, sob pena da extinção da espécie mais privilegiada existente sobre a face da Terra.
A Criatura ouviu atentamente toda a preleção do Criador e demonstrando sinais de preocupação, achou que seria impossível o cumprimento de todas aquelas exigências. Preocupou-se, sobremaneira, com as condições do acordo que estava sendo firmado, mas ao mesmo tempo ele se achava no dever de fazer algo em prol de seu povo e para não ficar em dívida com a sua consciência, disse ao Criador:
- Meu Pai, eu acho que não é preciso mudar nada não, pois o meu povo está vivendo muito bem. Deixemos tudo como está e, em vez de eu ter que cumprir tudo isso, apenas me conceda alguns anos a mais de vida e um pouco mais de poder, a fim de que eu possa permanecer no ápice do cargo político que ora me encontro e, assim, conseguir galgar outros daqui para frente.
- Da mesma forma, se não for Lhe pedir muito, me permita que eu mantenha pelo menos algumas daquelas contas bancárias que tenho no paraíso fiscal das Ilhas Caimãs, ou simplesmente aquelas poucas que ora mantenho na Suíça.
O Criador lhe respondeu:
- Tudo bem meu filho, nosso acordo está fechado, mas antes disso eu vou sugerir para o Congresso Nacional de seu país instaurar mais uma Comissão Parlamentar de Inquérito, visando à apuração desse desvio de valores para outros países.
A Criatura, preocupada com a possibilidade da perda do poder, Lhe respondeu:
- Meu Pai, eu reconheço que esse assunto é mesmo muito complexo, portanto, esqueçamos o pedido que fiz e cancele a proposição da instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito sugerida, pois eu tenho certeza que meu povo continuará com a Vossa ajuda, independentemente de eu ter que fazer ou não algo em benefício dele. De uma forma mais que insistente, a Criatura procurou seguir os passos do Criador que se afastava lentamente daquele local e, segurando nas Suas vestes, fez mais um pedido:
- Meu Pai, independente de eu poder continuar ou não representando bem o meu povo sofrido, pois sinto que essa é uma tarefa muito árdua para os governantes em geral nos dias atuais, eu poderei continuar mantendo as minhas contas bancárias no estrangeiro, a partir de agora?
O Criador, sem nenhuma parcimônia, assim lhe respondeu:
- Meu filho, é fato público e notório que ao longo de todo esse tempo em que a grande maioria dos representantes de governo das Criaturas, que tem tentado liderar seu povo e que se achado no direito de representá-lo política e socialmente, tem uma grande certeza: todo o povo tem o governante que merece, e o seu povo não será uma exceção. Portanto, não se aflija meu filho, faça aquilo que a sua consciência pedir para realizar aqui no plano terrestre. Não se preocupe com as necessidades do seu semelhante, portanto, gaste toda a verba do erário, da forma que você bem entender, pois o seu acerto de conta comigo já está bem próximo.
A Criatura, meio desolada, sobretudo preocupada com aquela situação, e sem saber o que fazer com tanto dinheiro, disse para o Criador:
- Está certo, meu Pai. Eu sei que de acordo com o Vosso entendimento a minha permanência aqui na Terra está por um fio, desta forma, eu não terei outra saída senão gastar com o “meu pessoal” todo o dinheiro que mantenho guardado lá no estrangeiro. Amanhã mesmo viajarei com minha esposa e meus quatro filhos para o Caribe e, em estando lá, após algumas semanas de raro lazer, estarei à Vossa disposição..."