NOIVAS DO CAFEZAL
Debaixo de um sol de quase 40°graus, elas suavam. Com seus corpos cobertos deixando à mostra apenas as mãos calejadas e grossas. O rosto era protegido do sol pelo chapéu e pelo lenço de pano branco. Nos pés, pesadas botinas encarquilhadas protegiam-nos contra os espinhos e gravetos das leiras no meio do cafezal.
Elas sempre estavam sorrindo e cantando alguma música das paradas de sucesso da época. Na maioria das vezes Roberto Carlos, eu acho...não me lembro bem. Sei apenas que cantavam enquanto faziam a derriça do café. Isso atenuava o trabalho cansativo de segurar as ramas cobertas de frutos vermelhos e com as mãos puxar com força para fazer os frutos se desprenderem do galho e cair na peneira...
Isso era feito com todo carinho, retirando apenas os frutos maduros. Quando a peneira estava com uma quantidade suficiente, elas sacudiam de maneira que os frutos subiam junto com as folhas e era separados de alguma forma ainda no ar, caindo novamente na peneira e as folhas indo para o chão...
Durante toda a manhã, até quase onze horas, era assim, a cantoria, a derriça, o abanar e as folhas verdes pelo chão...Então, elas deixavam suas peneiras junto aos pés de café, reuniam-se numa sombra de alguma mangueira e começavam a preparar o almoço - requentado. Faziam um fogão improvisado com duas pedras que já estavam separadas para essa finalidade, chamavam as crianças para buscarem gravetos e acendiam o fogo. A comida estava guardada em pequenos "caldeirõezinhos "com tampa e cobertos com um pano de saco branco e alvejado, sempre com algum bordado de flor numa das pontas...
Enquanto a comida esquentava na capa do fogão de pedras, elas colhiam a "mistura", alí mesmo, no cafezal. Eram pepinos e maxixes espinhentos que se
alastravam pelas leiras, almeirão do mato, serralhas ou beldroegas de folhas gordas e verdes...tudo era lavado com água trazida nas moringas de barro, que ficavam guardadas junto ao tronco de um pé de café para manter a "frescura", e tempradas com sal, azeite e limão numa bacia de alumínio. Era uma salada coletiva. Todas serviam-se da mesma.
Nos caldeirõezinhos, arroz, feijão, farinha, e um pedaço de charque ou carne de porco, destas que elas fritavam em pedaços grandes e guardavam numa lata com a própria banha. As vezes tinha um ovo frito, com sua gema amarelo forte, diferente até no gosto com os ovos que eu comia em minha casa...
A sobremesa sempre era melão caipira, melancia, manga ou mamão que era praga no cafezal. Aquilo tudo para mim era uma festa. Um manjar dos deuses. Sentia a amizade delas, o carinho umas com as outras, sempre dividindo o pouco que tinham... Dona Olinda, sempre preparava o meu "caldeirãozinho", tendo sempre o cuidado de colocar mais feijão do que arroz. Sabia da minha preferencia e sempre fazia isso de coração.
Depois do almoço, as crianças voltavam às brincadeiras, e elas ao cabo do rastelo e as ramas do cafeeiro. Isso varava a tarde. Uma cantoria de pombas rola e bem-te-vis era sempre ouvido. E ao longe o mugido triste dos nelores dava notas melancólicas anunciando o fim do dia. Elas enxugavam o rosto e descansavam suas peneiras e seus rastelos, chamavam novamte as crianças e lavando as mãos, dividiam entre nós um pedaço de bolo de fubá ou pão doce trazidos de casa. Enquanto comiamos o lanche, elas recolhiam suas coisas e em fila pelo meio do cafezal seguiam para suas casas alegres por mais um dia de trabalho. Deixando para tras aqueles pés de café, gigantes para minha pequenez.
Quando lembro-me da primeira vez que meu pai mostrou-me um pé de café florido de cima a baixo, imaginei uma noiva toda de branco, coberta de flores perfumadas onde as abelhas vem buscar o seu alimento...Ainda hoje não conheço nada mais belo que um cafezal em flor, embalado pela cantoria das mulheres e suas mãos carinhosas, mas aquele cafezal onde brinquei tantas tardes existe somente em minhas lembranças, assim como o gosto doce de seus frutos estarão comigo para sempre...
Debaixo de um sol de quase 40°graus, elas suavam. Com seus corpos cobertos deixando à mostra apenas as mãos calejadas e grossas. O rosto era protegido do sol pelo chapéu e pelo lenço de pano branco. Nos pés, pesadas botinas encarquilhadas protegiam-nos contra os espinhos e gravetos das leiras no meio do cafezal.
Elas sempre estavam sorrindo e cantando alguma música das paradas de sucesso da época. Na maioria das vezes Roberto Carlos, eu acho...não me lembro bem. Sei apenas que cantavam enquanto faziam a derriça do café. Isso atenuava o trabalho cansativo de segurar as ramas cobertas de frutos vermelhos e com as mãos puxar com força para fazer os frutos se desprenderem do galho e cair na peneira...
Isso era feito com todo carinho, retirando apenas os frutos maduros. Quando a peneira estava com uma quantidade suficiente, elas sacudiam de maneira que os frutos subiam junto com as folhas e era separados de alguma forma ainda no ar, caindo novamente na peneira e as folhas indo para o chão...
Durante toda a manhã, até quase onze horas, era assim, a cantoria, a derriça, o abanar e as folhas verdes pelo chão...Então, elas deixavam suas peneiras junto aos pés de café, reuniam-se numa sombra de alguma mangueira e começavam a preparar o almoço - requentado. Faziam um fogão improvisado com duas pedras que já estavam separadas para essa finalidade, chamavam as crianças para buscarem gravetos e acendiam o fogo. A comida estava guardada em pequenos "caldeirõezinhos "com tampa e cobertos com um pano de saco branco e alvejado, sempre com algum bordado de flor numa das pontas...
Enquanto a comida esquentava na capa do fogão de pedras, elas colhiam a "mistura", alí mesmo, no cafezal. Eram pepinos e maxixes espinhentos que se
alastravam pelas leiras, almeirão do mato, serralhas ou beldroegas de folhas gordas e verdes...tudo era lavado com água trazida nas moringas de barro, que ficavam guardadas junto ao tronco de um pé de café para manter a "frescura", e tempradas com sal, azeite e limão numa bacia de alumínio. Era uma salada coletiva. Todas serviam-se da mesma.
Nos caldeirõezinhos, arroz, feijão, farinha, e um pedaço de charque ou carne de porco, destas que elas fritavam em pedaços grandes e guardavam numa lata com a própria banha. As vezes tinha um ovo frito, com sua gema amarelo forte, diferente até no gosto com os ovos que eu comia em minha casa...
A sobremesa sempre era melão caipira, melancia, manga ou mamão que era praga no cafezal. Aquilo tudo para mim era uma festa. Um manjar dos deuses. Sentia a amizade delas, o carinho umas com as outras, sempre dividindo o pouco que tinham... Dona Olinda, sempre preparava o meu "caldeirãozinho", tendo sempre o cuidado de colocar mais feijão do que arroz. Sabia da minha preferencia e sempre fazia isso de coração.
Depois do almoço, as crianças voltavam às brincadeiras, e elas ao cabo do rastelo e as ramas do cafeeiro. Isso varava a tarde. Uma cantoria de pombas rola e bem-te-vis era sempre ouvido. E ao longe o mugido triste dos nelores dava notas melancólicas anunciando o fim do dia. Elas enxugavam o rosto e descansavam suas peneiras e seus rastelos, chamavam novamte as crianças e lavando as mãos, dividiam entre nós um pedaço de bolo de fubá ou pão doce trazidos de casa. Enquanto comiamos o lanche, elas recolhiam suas coisas e em fila pelo meio do cafezal seguiam para suas casas alegres por mais um dia de trabalho. Deixando para tras aqueles pés de café, gigantes para minha pequenez.
Quando lembro-me da primeira vez que meu pai mostrou-me um pé de café florido de cima a baixo, imaginei uma noiva toda de branco, coberta de flores perfumadas onde as abelhas vem buscar o seu alimento...Ainda hoje não conheço nada mais belo que um cafezal em flor, embalado pela cantoria das mulheres e suas mãos carinhosas, mas aquele cafezal onde brinquei tantas tardes existe somente em minhas lembranças, assim como o gosto doce de seus frutos estarão comigo para sempre...