Dia da Cara de Pau

A idéia de homenagear categorias em datas especiais não é original : surgiu para fomentar o comércio. Mais tarde, a internet pegou o gancho e hoje o correio eletrônico nos entope com mensagens do Dia do Amigo, do Beijo ( virtual?!), da Saudade...

Espero incluir meu nome na História, sugerindo a instituição do Dia da Cara de Pau. O lançamento oficial em Brasília precederia uma campanha mundial, patrocinada por Bush e Fidel Castro. O padroeiro já está escolhido: o Santinho do Pau Oco. Réplicas de imagens religiosas mineiras do século XVIII, em cujo oco contrabandeava-se ouro e pedras preciosas, seriam vendidas como souvenirs. Por fora, a pureza religiosa; por dentro só Deus sabe!

A data lavará a alma dos mais inibidos, boa oportunidade para ficar pau a pau com o falso amigo que posa de bacana, mas é mais underground do que o capeta. Jogadores perna de pau que se acham os tais, paus dágua e suas desculpas desconjuntadas teriam, enfim, um dia para chamar de seu ( assim como o Zé Dirceu!). Aos que metem o pau em você, desconsiderando as próprias limitações, bastaria um belo cartão. Antevejo a campanha publicitária : “Pra que quebrar o pau, se agora existe o Dia da Cara de Pau?”.

Finalmente saber-se-ia com quantos paus se faz uma canoa. O colega que apresentou como dele uma idéia sua faria jus a troféu alusivo à data. Garotas tratariam com devoção o namorado bissexto que aparece quando quer – nunca aos fins de semana! – e comenta “Menina, como você está sumida!”. CDs e livros seriam enviados aos que pedem objetos emprestados e apreciam tanto que nunca mais devolvem. Rapazes que justificam rupturas de relacionamento com a máxima “Você é boa demais para mim” ficariam inseguros ao receber telefonemas amistosos das preteridas : o risco que corre o pau, corre o machado. Nada de chutar o pau da barraca daquele ex-amigo a quem você emprestou dinheiro e que, além de não te pagar, ficou de mal. Ele há de te receber de braços abertos, na maior cara dura, neste dia.

Indústria e comércio matariam a pau. A venda de cera, óleo de peroba e lustra móveis atingiria patamares recordes. Todo o Planalto recenderia a lavanda e jasmim e, por um dia, o mau cheiro abandonaria nosso Reino da Dinamarca. Agências de turismo veriam esgotados seus pacotes para Brasília, a rede hoteleira teria ocupação massiva. O povo voaria de avião para homenagear sei-lá-quem: ainda não divulgaram os responsáveis pelo caos aéreo... Com risco dos computadores da torre de controle darem pau, eu não viajaria... nem a pau!

Político que se preza é pau para toda obra. Ministérios, senado, lobinhos e Lobões, câmaras de deputados e vereadores se fariam presentes na seção extraordinária de celebração da data, bandeira nacional hasteada a meio pau. Para culminar, nosso patrono mataria a cobra e mostraria o pau através de discurso em cadeia nacional. Provando que em casa de ferreiro o espeto é de pau, o Presidente Lula reafirmaria desconhecer as mais recentes negociatas nos bastidores do seu governo e garantiria rigorosa investigação. Ao fim, reeditaria o Manifesto Pau-Brasil – o Modernismo também irrompeu nas hostes de esquerda -, comprometendo-se a eliminar de vez a desigualdade social.

“ Nunca antes na história deste país...”

Cara de pau que nasce torto...

Maria Paula Alvim
Enviado por Maria Paula Alvim em 31/01/2008
Reeditado em 02/02/2008
Código do texto: T841128
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