A Crônica que o Nélson Rodrigues não Escreveu
Através das narrativas do “seo” Heitor eu fiquei sabendo de muita coisa sobre o futebol, e eu vou tentar por no papel algumas dessas coisas, mas talvez meus colegas escritores não aprovassem minha linha de trabalho. Sou amigo de detalhes, se eu sair muito do tema principal, por favor me avisem que eu retornarei imediatamente.
Eu ouvi do “seo” Heitor que corria o ano de 1934, 6:30 h da manhã, estação de trens de Campinas. Vinha chegando na plataforma destinada à Mogiana, o noturno vindo de Ribeirão Preto. Muita gente esperando o trem: agenciadores anunciando as suas pensões e hotéis, carregadores de malas, funcionários da ferrovia, e como não poderiam faltar, os batedores de carteira. Quando a velha “raposa” 262, locomotiva vinda da Filadélfia, USA, parou, era gente para todo lado. Dez carros lotados de passageiros.
Está bem, já vou entrar no assunto central desta crônica. Junto com os passageiros vinha um moço para treinar no Campinas F. C. indicado por algum ferroviário, sócio do “tricolor vilense”. Foi recebido na estação por um diretor do clube que o acomodou numa pensão familiar, como eram todas naquele tempo.
Ainda segundo o “seo” Heitor, o moço, tão bem recomendado, treinou duas vezes e mostrou ser bom jogador, mas não poderia ser aproveitado, visto que o Campinas F. C. tinha em suas fileiras quatro meias muito bons. Na direita, Pérez; na esquerda Daniel, e despontando mais dois: Felício e Gambeta. O tricolor, nas palavras do “seo” Heitor, era um esquadrão. Indalécio, Orlando e Chico Urbano; Mané, Elegância e Palma; Von Zuben, Pérez, Casimiro, Daniel e Carlinhos.
Assim, o moço veio fazer teste, aprovou mas não ficou. Ai, um viajante que estava na Casa Bonturi ficou sabendo e levou o jovem para Santos, onde foi treinar na Portuguesa Santista, e em 1935 e 1936 ficou na “briosa”, indo depois para o Fluminense. Em 1938 era o maior meia esquerda do Brasil. Disputou o Mundial da França e encantou a todos. Os argentinos e os uruguaios que haviam jogado contra ele, em Sul-americanos, o apelidaram de “él Peón”, dada a facilidade com que driblava, sempre para frente. Este moço, que não foi aproveitado pelo Campinas F. C., se chamava Elba de Pádua Lima, que viria a ser o famoso Tim.
Vocês poderão me perguntar como eu tinha tantas informações do “seo” Heitor. O “seo” Heitor era o meu pai.
O famoso cronista e dramaturgo Nélson Rodrigues era torcedor apaixonado do Fluminense, tendo relatado em suas crônicas na imprensa carioca, muitos momentos do tricolor das Laranjeiras, e do futebol brasileiro. Daí a referência ao ilustre escritor.
LAÉRCIO ROSSI
10/01/2003