Fim de linha...
O dia amanheceu ao fim da madrugada, haveria de ser diferente? O ônibus lotado e o táxi-lotação com ele disputando o passageiro que paga mais caro, para que chegue mais ligeiro ao emprego. O patrão paga hora extra, mas corrida extra essa é paga por conta de quem a usa. São quatro lugares para passageiros e um motorista. “Que bom lotou!” diz um otimista viajante do banco de traz. “Mais um para morrer se houver um acidente”, diz aquele passageiro sarcástico que ocupa solitário um dos bancos dianteiros. A corrida, de quarenta quilômetros e dezenas de engarrafamentos é feita em meia-hora, que maravilha!
O dia acabou com o inicio da noite, haveria de ser diferente? O ônibus novamente lotado sofre a disputa do táxi-lotação, que mais uma vez procura o passageiro que paga mais caro, para que chegue mais ligeiro em casa. Novamente as mesmas conversas fiadas dos passageiros, que se vêm e se comunicam nas corridas entre casa x trabalho e as do trabalho x casa. Tudo inutilidades e rotina. Menos para ela jornalista, sábia passageira que tudo anota. Um dia fará um reportagem sobre aquela maneira de se transportar, descontraido para não contrair com o medo. Afinal são dois riscos ao dia, um pra lá e outro para cá! Fora as broncas do patrão, o dia foi maravilha!
“Papai o que trouxe para mim?”, o pai quase choroso diz: “Eu, um beijo e um abraço”, e chora copiosamente ao receber por soresposta: “Você não serve!”, mas se consola ao ouvir: “Você já é meu”. Crianças sempre esperam alguma coisa diferente do que já têm, pode ser uma lembrançinha da loja de R$ 1,99. Pode ser um presente contrabandeado do Paraguai ou da China! As crianças ainda não entendem de patriotismo e nem de qualidade industrial, e parece que poucas mesmo a chegarem adultas entenderão. Se a qualidade do presente não for boa, no dia seguinte apenas a jogam lá pro canto.
Não é necessário ser um ritual diário, mas pelo menos a cada semana um pai deve se manifestar com algo embrulhado a alegria de cada dia em ter trazido você! Foia assim que ele, o pai de cada dia e de uma folga por semana, lembrou que nem em Natal, Ano Novo ou ainda carnaval para ele é feriado, mas naquele fim de semana compraria um brinquedo de boa procedência e qualidade, o levaria junto com a nota fiscal para dar àquela menina que dele fazia um ídolo, o seu super-homem!
No táxi-lotação pela manhã o repetido ritual trazia um enorme pacote surpresa para seu pequeno grande amor. A viagem corria normal até passar na linha vermelha. Naquela quente noite era um frio dia urbano. Freada brusca; dois capuzes em baixo de dois capacetes e uma moto embaixo de dois assaltantes. Um pacote preso em dois braços e uma reação. Ninguém contou os tiros. Na casa de subúrbio amanhece o dia em escuro luto. A menina olha o portão e pergunta: “Meu presente vem para casa hoje?”