A RECEITA DA VOVÓ

A vida continuava a mesma, aos domingos a macróbia vovó Miralda esquentava e requentava seus pratos prontos no forno de microondas. Cansou de cozinhar aos domingos para populacho da vizinhança, que, aliás, já fazia uns vintes anos que filavam uma “boinha” no casarão da Rua Capitão Antonio Gonçalves. A doce senhora virou adepta dos pratinhos de supermercado. Como ela mesma dizia:

- Chega! Independência pra quem esquenta a barriga no fogão e esfria na pia!

Ela estava correta, por dois motivos; primeiramente eram maravilhosas lasanhas, inhoque, capeleti, canelones, e segundo que eram tempos do feminismo estampado para todas as idades. A própria vovó tinha varias camisetas com os seguintes dizeres: “abaixo a dominação masculina". Nas discussões sobre esse tema sempre concordava plenamente com ela. Em discurso à macróbia afirmava que para muitos homens, inclusive o seu finado esposo, que o casamento era um meio de reprodução. Já o corpo da mulher apenas o instrumento, por isso todo o trabalho doméstico é tido como natural, umas das atividades associadas ao tema maior; reprodução. Ela ficava nervosa com esse sofisma. Todavia, penso que os leitores devam estar mais interresados mesmos no fato de que como uma aposentada ganhando uma mirrada pensão suporta os preços tão elevados dos produtos congelados. Também gostaria de saber, entretanto ela sempre escorregava no “quiabo”. Desculpa pelos quiabos que já não entrevam na casa da vovó fazia uns quinze anos. Num belo dia, o casarão lotado, todos comendo e bebendo, uma prima recém casada chamou a macróbia no canto da cozinha e disse que queria aprender como se fazia aquela lasanha divina.

- vovó Miralda como se faz essa lasanha?

- Uai! È só ir ao supermercado comprar e botar pra assar.

- Isso eu sei vovó! Quero mesmo fazer a lasanha render muito! Aqui na sua casa a caixinha de 650g rende uns 10 quilos!

- Ora bolas Amélia! São truques da vovó! Faça umas cinco lasanhas em casa e bota pra assar.

- Na hora de servir fala que é congelada e que não gosta de cozinhar pra não perder a pose.

Osório Antonio da Cunha
Enviado por Osório Antonio da Cunha em 26/01/2008
Código do texto: T833920
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