LÁ VEM O TREM...

A mocinha loura, de cabelos cacheados, acordou bem mais cedo do que de costume. Tinha colocado um despertador bem velho e barulhento, no chão ,e bem ao lado da sua cama. Demorou para adormecer. Seus pensamentos variavam com uma velocidade nunca sentida por ela. Virou e revirou na cama... mas adormeceu.

Logo, de manhã , Tina, ainda com os olhos semi-cerrados olhou para o despertador . Estava na hora. O coração bateu mais forte... Pulou da cama, espreguiçou já de pé, caminhando para o banho. Desfez a trança e em seguida , um muchocho : será ? Ficou atenta, franziu a testa e.... não, disse ela. Não é barulho do trem.

Tomou seu banho com o seu melhor sabonete. Na véspera teve o cuidado de ir à venda e perguntar ao sr. Ramiro qual o sabonete mais perfumado que havia na loja. Ele mostrou. Ela colocou o sabonete junto às narinas, sentiu o perfume suave ,e contando o dinheiro , observou que faltavam alguns centavos. Timidamente, pediu se podia ficar devendo o restante.

Seu banho foi rápido. Medo de que o trem chegasse ,antes dela ,na pequena estação. Arrumou-se bonita. Um vestido de chita, com florzinhas amarelas e vermelhas. Manguinhas franzidas com um pequeno punho.Saia tipo longuete e franzida na cintura. Completou o traje com um sapato preto fechado e com um amarrio em cima do peito do pé. Refez a trança, e saltitando correu para o terracinho da casa de madeira , pintada de azul. Olhou para o leste e percebeu que o sol já nascia. Ai...estava em cima da hora... Desceu os 3 degraus da escada, bem devagar para não acordar a mãe que dormia no quarto ao lado do seu. Pulou uma touceira de capim, desviou de uma roseira e tomou o caminho da estação.

Aí sim, ouviu o tchec tchec do trem. Apertou o passo. O coração saindo pela boca. Chegou na estação ao ouvir o apito do trem.... Suas mão suavam... seu rostinho de menina-moça ficou rosado. Os olhos argutos olhando para a curva do trilho... outro apito e o tem foi chegando....chegando , freando, freando, até que parou. Desesperada olhava por todos os lados... corria de um extremo ao outro. Tornou a olhar.... e não via... não via... Tirou do bolso a cartinha e leu : devo estar com uma botina nova, talvez até com o selo ainda grudado na sola. Uma calça de brim rústico na cor marrom. Uma camisa de mangas longas e listrada. Um cinto já meio velho mas que vai dar para tapear. E sobre o lábio superior um pequeno bigode. Acho que você vai gostar. Afinal faz 5 anos que não nos vemos. Desde que eu fui para o cerrado. Então não vá estranhar o meu cha -peu .Chapeu de feltro de abas estreitas e também de uma cor escura.

Ahhh...ficou mais fácil.... e corre pra lá e pra cá... e vai e volta e olha.... olha..... e ouve, trêmula o trem apitando e partindo....partindo. Leu, de novo a carta . Teria errado a data ?

E ,só aí ,viu o que não gostaria de ver. Dizia : meu bem, minha saudade é muito grande , mas viajarei com Deus e tudo vai dar certo. Mas se eu não chegar , é porque já não estou mais viajando. Já estarei ,lá em cima ,na casa do Senhor. Um beijo de quem te ama ...Vicentino.

Fechou a cartinha , há tempos recebida. Apertou-a com força .Colocou-a junto ao seu coração..... e no seu rosto só se via um mar de lágrimas.