Uma flor para Bobby Fischer

Bobby Fischer morreu e explodiu a discussão na editoria de esportes onde trabalha o jornalista Coimbra. Sempre impecável preferiu omitir as opiniões dessa explosão margeando a diferença entre “esporte” e “jogo”. Para compreender a indiferença dos esportes oficiais torna-se necessário considerar um primeiro momento de todas as demais conceituações: o xadrez não possui o narcótico dos esportes. O homem como ser racional (ab ovo) tem em seu processo interno o jogo dos raciocínios semelhante ao xadrez. E o xadrez é o seu modelo essencial. Todos os demais eventos ao lado do xadrez beiram a inocência quase cômica do ridículo. Podemos considerar que há nele todos os demais, ele em si é o modelo de nosso psiquismo. É, portanto desmoralizante, para os demais esportes; bem como a profissão de professor mantida sem a menor chance de prêmio gordo de cinqüenta mil reais ao largo da experiência profissional. Por conter a essência invejada. É reconhecida, mas desprezada pelo afago ao lucro das massas. A especulação simbólica dos jogos não pode ser considerada sem a narcotização oriunda das paixões inúteis e alienantes.

No xadrez não ocorre o mesmo ímpeto. Não há perdedores. Existe a reeducação em adulto de uma profunda lição infantil: olhe com os olhos e não com as mãos. O que torna o cálculo mental dos praticantes resultado mais sábio a cada experiência. Indiferente do resultado e longe da alienação compulsiva. E é uma grande pena o assunto não se expandir. É uma grande pena o tema estar confinado em meia lauda como se fosse uma nota de rodapé. Só a verdade essencial combina com essa arte. O resto não passa de suador e fetiche milionário o que não se pode desconsiderar em nome da grandeza e da vaidade. É impossível falar sem pedir perdão ao mesmo tempo. É impossível discorrer sem indelicadeza a maioria reinante nas grandes vitrines sentimentais.

É como Fischer um esporte expatriado pela sua universalidade. Um libelo aos direitos individuais graças ao simples direito de jogar uma partida quando bem entender em qualquer região do globo azul de Yuri Gargarin.