Poesias em penca

A cultura vai além do horizonte. Consegue, ao misturar imagem e palavra, curar até mesmo as dores da alma.

Falando nela, hoje remonto ao ano de 2011, ano fundamental para a minha trajetória literária. Eu tinha acabado de sair de um casamento fracassado e, sem ter muito caminho a seguir, resolvi procurar a Casa de Cultura Mario Quintana, em Porto Alegre, em busca de alguma oficina literária. Sempre gostei de escrever, mas desconhecia qualquer técnica.

A Casa me abrigou de pronto. Lá me deparei com uma Oficina de Poesia e Linguagem, ministrada pelo Mario Pirata, um poeta-brincadeiro que continua andando na corda bamba da saúde até os dias atuais. O homem é de ferro. Com ele aprendí a relaxar, a escrever poesia sem muita métrica e a brincar com a arte nos meus escritos. Lembro-me de ter escrito uma poesia que era finalizada com a palavra “s-e-r-e-n-a-m-e-n-t-e” com as letras separadas por hífens, buscando dar sentido visual para a palavra. Amei aquilo e comecei a dançar nas minhas poesias. Lembro-me de outra que eu escrevi a palavra “caindo” com cada letra em uma linha, como se a palavra estivesse literalmente caindo. Foi um aprendizado e tanto.

O Mario costumava organizar saraus literários no Jardim Lutzemberger, no terraço da própria casa. Lá, no Porto Poesia de 2011, dependuramos nossas poesias em pequenas árvores, que ficavam balançando ao vento, enquanto sentados discutíamos as mais variadas facetas dessa arte, já que a literatura vai muito além de documentar a cultura, ela também a define, influenciando comportamentos, crenças e valores.

A Oficina e seu aprendizado e os colegas começaram a aconchegar-me e, sem perceber, eu já estava envolvida por completo, s-e-r-e-n-a-n-d-o para a vida.

Certa noite, lembro-me que uma linda noite de verão, ao chegar na Casa fui direcionada pelo atendente para uma Sala de Exposições no 2º andar, possivelmente a pedido do Mario. Lá chegando eu fiquei encantada com o que ví. Era uma sala imensa que abrigava no centro um tipo de pinheirinho de natal estilizado, produzido com fita crepe transparente com o lado adesivo para fora, onde eram grudados post-its escritos com poesias. Uma verdadeira obra de arte. Pura cultura! Nele eu afixei uma poesia escrita rapidamente na entrada, debruçada sob uma pequena mesa que continha vários bloquinhos de post-its. Fiquei, junto com alguns colegas, lendo algumas das inúmeras poesias que devem ter sido fixadas por pessoas das mais vArIaDaS idades, condições e, especialmente, formas que chegaram até alí. Acredito que muitos visitantes ousaram escrever algo, mesmo que nunca tenham escrito qualquer coisa, para deixar alí, naquele amontoado de palavras que, olhando de perto, confundiam-se umas com as outras, pela transparência das fitas.

Assim como a vida no seu dia a dia, uma simples manifestação cultural, escancarando a GRANDEZA da arte.

Crônica escrita para a Oficina de Crônica da Pragmatha Editora - Crônica Produto Cultural

Rosalva
Enviado por Rosalva em 08/04/2025
Reeditado em 15/05/2025
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