Aquela sopa
Quanto tempo já se passou e eu ainda sinto o sabor daquela sopa que nunca experimentei. Eu era uma menininha muito recatada e calada. Mas observava compreendendo tudo por onde eu caminhava e aonde eu ia e com quem eu andava.
Morávamos num bairro na beira do Rio Iguaçu, “São Bernardo”, “União da Vitória, PR”, majestoso rio, que nasce em Curitiba, e deságua em Foz do Iguaçu.
Onde as lavandeiras labutavam lavando roupas alheias para criarem seus filhos. O rio era a ferramenta da renda delas. Minha mãe fazia parte deste gueto.
Eu nasci em mil novecentos e cinquenta e oito. Era o sanduíche de oito filhos. As famílias na época eram grandes. Não conheci meu pai. Só sei que tive uma mãe lavandeira e que vivenciei muitos momentos enquanto era muito pequena. E lembro-me de tudo muito bem.
Um desses quero registrar, lembranças que vivenciei, que vez ou outra acionam um gatilho quando preparo uma sopa. Jamais fica parecida como aquela que não degustei...
Quero voltar àquela sopa, que quando lembro, ainda exala em mim um sabor que eu muito queria ter sentido. Por mais que eu faça e experimente outras, nunca será igual àquela de que eu vi e senti o cheirinho. Quando vislumbrei a pessoa comendo, meus sentidos sentiram o que ela estava apreciando.
Havia uma vizinha nas redondezas, muito carola, e que vivia nos velórios e nas igrejas. E a danada me levava por tudo. Minha mãe ausente e com toda a filharada para criar e precisava trabalhar, deixava-me levar por esses acontecimentos sem saber por onde eu ia.
Eu na minha ingenuidade inocente, só queria alguém para comigo ficar, então acompanhava aquela mulher. Mas tudo eu odiava, sentia frio, cansaço e fome. Queria um aconchego familiar.
No entanto, quando ela chamou uma outra pessoa para ir junto na novena de quinta feira, muito me alegrou. Chegamos naquela casa, um cheirinho de comida indescritível...
Ela, a mulher que iria conosco degustava uma sopa que saliva em minha memória até hoje.
Ainda sinto o sabor daquela sopa quente que a pessoa degustava e dizia: Primeiro vou comer e depois nós vamos.
Eu, acabrunhada e com muita fome, salivava...
Por mais sopas que eu faça, ainda lembro daquela inigualável, que muito desejava degustar naquele momento da minha fome.
Texto: Miriam Carmignan
Crônica