A (IN)ESPERADA VISITA DA VIOLÊNCIA
Apesar da violência crescente no país e mesmo em minha cidade nunca pensei ficar refém da mesma, tendemos a acreditar que estas coisas só acontecem no vizinho, mas aconteceu comigo. Era apenas uma segunda-feira como outra qualquer, quase todos haviam saído ou ainda não haviam retornado do trabalho, em casa apenas eu e Gidalya – a menina que mora comigo. Estava em meu quarto lendo quando ela entrou muito pálida seguida de um rapaz, falou alguma coisa que não entendi.
O rapaz anunciou que queria apenas que eu o ajudasse. Pensei tratar-se de um pedinte que tendo encontrado o portão aberto tivesse invadido a casa, só quando ele repetiu que queria apenas o dinheiro e os celulares e que não queria fazer nada contra gente eu entendi tratar-se de um assalto. Estranhamente calma argumentei que não dispunha da quantia pedida, mas ele insistiu que queria dinheiro, qualquer quantidade, mas precisava do dinheiro.
Numa atitude estúpida disse-lhe que meu marido havia saído, mas voltava logo, ele podia sentar e esperar. Claro que ele não aceitou, percebi que ele estava completamente drogado e mal conseguia falar ou manter-se em pé. Então me levantei e disse que ia olhar se encontrava dinheiro na carteira dos meninos, ele seguiu na frente e eu a menina logo atrás, entrei no quarto de meu filho e abri as gavetas, mostrei-lhe que não havia dinheiro em casa.
Fomos para o outro quarto, lá ele pegou um celular e colocou no bolso, quando ele abaixou-se para abrir as gavetas percebi que a arma que ele usava era uma faca enferrujada sem cabo ou ponta, então puxei o braço de minha companheira e corri para rua deixando-o sozinho dentro de casa. Chegando à calçada não vi ninguém na rua e comecei a gritar por socorro. Os vizinhos começaram a aparecer e tudo que eu conseguia falar era: liguem para polícia, tem um homem armado lá em casa.
A essas alturas surgiu gente de todo lado, alguém ligou para a polícia, outros foram avisar aos vizinhos da rua dos fundos para ficarem alertas; a polícia, como de praxe, demorou anos para chegar, mais calma consegui dizer que a arma na verdade era uma faca, alguns vizinhos reuniram-se e resolveram entrar lá em casa. Ele já havia fugido levando apenas dois celulares, meu notebook estava suspenso, creio que ele tentou levar e não consegui livrar-se dos fios. Os policiais entraram em todos os muros e casas a pedido de seus proprietários, mas o jovem assaltante não foi encontrado.
Tudo acabado, veio o medo. Tive um acesso de choro que quase não consigo me controlar. Pela primeira vez na vida percebi que as balas perdidas, a violência está sempre mais próxima do que imaginamos. Aquele belo rapaz, com a idade de meus filhos, fruto dos desajustes sociais poderia, em seu desespero, ter morrido ou matado alguém. Pelo estado em que ele se encontrava até eu, se fosse um pouco mais corajosa o teria rendido, pois assim como sai correndo deixando-o sozinha em casa eu poderia tê-lo trancado no quarto até a chegada da polícia. Mas o instinto de defesa da vida está acima de qualquer prudência ou atitude que você possa imaginar. Naquele momento eu só pensei em defender nossas vidas. Passado o momento você imagina mil coisas que poderia ter feito.
Apesar do susto agradeço a Deus por não ter sido ferida e pela coragem de minha jovem companheira que teve a faca encostada em seu pescoço e conseguiu manter-se calma o suficiente para não tornar ainda mais grave a situação, pois o que mais assustava era o estado que o jovem se encontrava. Esta foi sem dúvida uma das piores situações que já vivi. E nesse momento nos perguntamos: o que estão fazendo com nossos impostos? O que é feito com o dinheiro que deveria assegurar nossa segurança? Onde estão às escolas para estes adolescentes que deveriam estar aprendendo lições de cidadania e não aterrorizando as famílias? E nós, cidadãos, o que estamos fazendo, seremos exemplos a ser seguidos?