Morando aqui nos EUA há 36 anos, esta semana tive minha primeira experiência de fazer uma visita no hospice. Você sabe o que é hospice aqui nos EUA? Esse é um hospital que trata de doenças terminais. Quando o paciente não tem mais nenhuma esperança de vida, ele vai para esse lugar, onde há enfermeiros(as) especializados em cuidar de pacientes no fim da vida.
Essa pessoa que fui visitar trabalhou comigo por 10 anos, e, quando saí da companhia em 2004, nunca mais o vi. Por esses dias, soube que ele estava enfrentando um câncer agressivo e tinha decidido parar com o tratamento. Ja fazia tratamento ha muitos anos, mas agora havia atingido os dois pulmoes. Que coisa mais triste!
Parei meu carro em frente ao hospice e fiquei me preparando para entrar. Tudo o que eu queria era dar um pouco de alegria, de energia, para esse meu amigo. Respirei fundo! Fiz uma prece!
Dennis sempre foi uma pessoa muito alegre, divertida, piadista, forte, decidido, trabalhava com tanta energia! Entrei naquele lugar com meu coração na mão, sabendo que seria uma tarefa difícil. Mas há coisas na vida em que precisamos ser fortes e pensar em dar aquele “algo mais” às pessoas que precisam.
O tempo pode mudar tudo, mas não apaga a essência de quem somos.
Entrei no quarto, um pouco escuro, e lá estava ele sentado na cama, sem cabelo (depois de tantas quimioterapias), com aquele mesmo sorriso. No silêncio daquele quarto, percebi que a presença vale mais do que qualquer palavra dita. Há momentos em que um simples toque de mão vale mais do que mil palavras.
Segurei sua mão e relembramos os velhos tempos, dando boas risadas de fatos acontecidos. Enquanto ele falava, eu olhava para ele, sem acreditar que aquela pessoa ali era o mesmo Dennis que conheci. O que a doença faz com as pessoas!
Entre risos e lembranças, tentamos enganar o tempo, mas ele segue seu curso implacável. A vida é frágil, e cada instante vivido é um presente que não pode ser desperdiçado.
Fiquei segurando sua mão, ouvindo histórias, rindo com ele e, ao mesmo tempo, olhando para seu rosto e pensando: “Logo ele não estará aqui.” Que sensação mais triste! Antes de sair, beijei seu rosto e fixei na minha memória sua última expressão. O que me pareceu é que ele estava sereno, sabendo que seu tempo aqui havia acabado. Sessenta e dois anos, cheio de vida, com esposa, filhos e netos. E dando adeus à vida.
A vida é uma estrada com muitas despedidas, algumas esperadas, outras que nos pegam de surpresa.
Nestes próximos dias, sua morte é esperada. Saí me sentindo tão pequena em relação ao mundo e a tudo. Fiquei a pensar que somos tão pequenos! Sentei no meu carro e fiz um rápido retrospecto da minha vida - mas, por outro lado, fiquei feliz de ter ido e de ter dado a ele alguns momentos de lembranças e alegria.
Saí dali carregando no coração um misto de tristeza e gratidão — tristeza pela despedida, gratidão pelo reencontro.
Despedidas nos lembram do valor dos momentos simples, aqueles que, muitas vezes, passam despercebidos. Como quando segurava sua mão em silêncio e seu olhar me dizia tudo.
Talvez seja justamente nesse silêncio que se esconda a verdadeira música da vida — aquela que, por ser inescutável, só se revela no coração de quem sabe ouvir.
Que nossa caminhada seja repleta de gestos que façam a diferença na vida de alguém.Sei que encontros assim nos fazem refletir muito sobre a nossa própria caminhada. E eu refleti.
Que Deus o receba em seus braços com carinho e ternura, em agradecimento por tudo que você fez aqui.
Na hora do lanche, o controle remoto na mão!
Até qualquer dia, Dennis!
Tive a noticia hoje, 21/02 - que Dennis morreu essa manhã.