Jardim da Infância
Ela era uma criança tímida e sozinha. No Jardim da Infância – ao contrário do irmão afogado nas próprias lágrimas –mantinha olhos secos , sempre a namorar o chão. Seus passos eram inseguros, mas tentavam parecer firmes ao percorrer o corredor até a sala de aula.
Ela era o que queriam que fosse, tentando corresponder as expectativas alheias.
- Uma mocinha.
- Muito mais madura que o irmão.
- Não chora e nem reclama.
O que não desconfiavam, é que estava só tentando cumprir seu papel.
Durante o horário das aulas, sentava quase se escondendo dos outros em um cantinho discreto da sala. Mal abria a boca durante o dia. Ao sinal do recreio, passeava muito devagar pelo parquinho, conversando em pensamento com os brinquedos. Seu melhor amigo era o escorrega vermelho, brinquedo menos freqüentado pelas outras crianças, e por isto mesmo, o preferido da menina.
No final de tarde, ao chegar em casa, sentia-se aliviada, reinando em seu quintal, soberana entre os brinquedos espalhados.
Diziam que era linda.
- Mas mamãe, eu sou gorda.
- Minha bunda não é redondinha como o de maninha.
- E nem tenho os seios fartos como os dela.
Palavras conotando uma inveja ingênua -que sentia da irmã mocinha – mais velha uns onze anos. Os seus sentimentos, portanto, eram naturais e típicos da idade.
Suas palavras eram ignoradas, talvez pelo excesso de zelo dos pais, evitando sofrimento.
- Que menina inteligente.
- Tão estudiosa
Despediam-se ao deixá-la todo sábado na porta do cursinho de inglês. Ela ficava e todos iam para a praia. Desta forma, lá estava ela resignada e pensativa, chegando a equivocar-se em suas conclusões:
- Acho que meninas lindas não gostam de praia. Elas só gostam de estudar inglês.
Pouco tempo depois, desistiu do curso. E de muitos outros que fez.
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