Muita areia para o teu caminhãozinho

Considero-me uma garota bonita, inteligente, simpática e feliz.

Aconteceram uns revertérios na minha vida que nem é bom comentar para não baixar o astral de quem estiver lendo.

Tenho vinte e poucos anos, ou seja, menos de vinte e cinco, senão diria: tenho vinte e muitos anos. Hoje, estou contente demais, morando com meu primo, sua esposa e suas duas graciosas filhas.

Estudo, trabalho e ajudo os que me ajudam no que posso e tento fazer até o que não posso para agradá-los como forma de retribuição pelo apoio.

Uma semana antes do Natal, ganhei uma passagem de excursão de meu avô. Fomos até Gramado apreciar as belezas que oferecem aos turistas ávidos por atrações natalinas. Nesse passeio, só de nossa família estavam: além de meu avô, o tio-avô, o tio palhaço, desculpem, é no bom sentido, uma tia, uma prima e as duas primas-netas. Não sei se existe esse último título, mas é o que pude arrumar.

Não vou comentar como estava agradável a cidade, o passeio de trem, a visita à fábrica de chocolates e a alguns parques.

Explicarei sobre os acontecimentos que descontraíram quem passa por momentos delicados e quer viver com alegria.

O guia turístico era um gatão. Era quase um quilômetro sexual, porque os metrossexuais ele deixa comendo poeira, atrás do ônibus de dois andares. Comecei a puxar conversa, mas o cara não me dava a mínima. Pensei comigo: não vou desistir.

Meu tio, muito querido e brincalhão, para pegar no meu pé disse:

- Ele é muita areia para o teu caminhãozinho.

Levei a frase a sério e ao mesmo tempo na brincadeira. De certa forma, para ver se conseguia provar o contrário. Também usava a diversão para sacanear com meu tio querido.

Cristaldo foi o nome que o alcunhei antes de saber o verdadeiro. Perguntada qual o motivo, respondi com a voz segura:

- Para mim ele é um cristal virgem. Terei que lapidá-lo para brilhar e ofuscar a todos, menos a mim, que estou apaixonada.

A gargalhada foi geral.

O rapaz era marinheiro, digo, passageiro de primeira viagem a comandar quarenta pessoas, a maioria da terceira idade.

Provavelmente, estava nervoso, mas não demonstrava. O percurso inteiro me ignorou e meu tio sempre pegando no meu pé, apelidou Cristaldo de areia e eu de caminhãozinho.

Fim da viagem e só um beijo de despedida no rosto. A gozação foi enorme.

Dois dias depois o encontrei na praia. Eu estava em férias e ele, se dirigindo para a academia. Batemos um papo e seguimos nosso rumo. No outro dia, escolhi o percurso dele, tirei a bicicleta da inércia e fui pedalar. Ao encontrá-lo fiz cara de surpresa e conversamos bem mais. Marcamos encontro para o final de semana. Saí duas vezes com ele. Não sei se continuo, para provar ao meu tio o contrário ou se é por que estou gostando dele de verdade.

Para o Cristaldo, aliás, Tales, eu não digo, mas para meu tio não canso de falar:

- Eu sou muita areia para o caminhãozinho dele.

Aroldo Arão de Medeiros

18/01/2011

AROLDO A MEDEIROS
Enviado por AROLDO A MEDEIROS em 17/01/2025
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