Somos parciais
Das poucas crônicas que escrevi, esta é a primeira que iniciei pelo título porque acredito na literalidade da expressão. É possível que nela se encerre a razão de não sermos “divinos”. Porém, nesta ocasião, ambiciono menos que a pretensão de abordagem tão distante e, certamente, bem mais profunda. A interligação com o divino se dá ao ligá-la ao assunto “religião”, onde a simples discordância entre elas ou mesmo a diversidade de doutrinas de uma mesma religião revela o quanto não enxergamos objetivamente algo que apregoamos ser a coisa mais importante que temos. Afinal, trata-se do estado em que estaremos pela eternidade. Isso poderá ter relação com a intensidade de fé de cada um, mas o que se polemiza é a forma como exercitamos. O registro central é de como não conseguimos extrair da essência dos ensinamentos religiosos um mesmo enfoque, seja por ruídos de interesses econômicos, ambições de poder ou vaidade, já que o traço comum entre as religiões é o desenvolvimento da alma, espírito ou equivalente (sem entrar no mérito das definições) através da generosidade, do amor e da humildade, entre outros valores ocidentais ou orientais. É como se quiséssemos fazer prevalecer a forma sobre o objetivo. A estética sobre o assunto. O corpo sobre a alma. Há, entretanto tendências de algumas religiões a querer conciliar num mesmo barco valores de muitas outras. Seja por purismo ou convicção essas não aceitam tal ecumenismo. O abismo é grande demais.
A onde haja um grupo social haverá um conjunto de idéias comuns com linguagem própria tida como costume. O que leva os grupos a adquirirem costumes diferentes entre si (não necessariamente sem semelhanças) que têm as mais variadas origens. Essa multiplicidade de comportamentos de grupos revela a independência das mentes para criar e transformar em verdade a sua criação e, através de lideranças, imporem ao integrante menos rebelde, que se verá reconhecido tanto quanto creia no que seu grupo crê. Dessa forma institucionalizaram-se as diferenças por razões as mais diversas. Evidentemente a saúde da convivência social passa pela captação das boas idéias. Pela quebra sucessiva de paradigmas logo transformados em costume numa velocidade muitas vezes exponencial. Contudo, as crenças podem revelar que a lógica que prevalece é a da parcialidade nem sempre transformada em parceria. Essa abnegação em torno de uma idéia tem trazido prejuízos na mesma medida dos lucros. ...Mas haverá quem discorde dessa igualdade.