Meu ídolo

Helinho lá com seus quatorze anos era um rapazola magrinho que não demonstrava a força que possuía. Desde cedo ajudou os pais no sustento da família. Mais tarde vim a ter maior intimidade com o rapaz franzino que só fazia o bem, não interessando a quem. O que me fez ficar ainda mais seu fã foi o que me contou há alguns dias:

- Eu estava levando comida para uns trabalhadores do porto, marmita preparada por minha mãe. De repente o Seu Eduardo Lima, um senhor conhecido por sua avareza, me chamou.

- Moleque você quer carregar essas tábuas para dentro do meu terreno? Te pago oito cruzeiros.

- Se o senhor esperar que eu leve essas quentinhas até o porto, farei logo em seguida, respondi sem pestanejar.

Helinho foi quase correndo se desfazer das marmitas. Quando chegou perto da empreitada é que reparou na quantidade enorme de tábuas, todas madeiras de lei, pesadíssimas. Levou um tempão para carregá-las sem ajuda de alguém. Foi pedir o pagamento, mas o pão-duro disse que, no momento, não tinha para lhe pagar. Passaram-se os dias e em mais três tentativas Helinho ficou sem o seu justo pagamento. O jovem não se abateu, perdoou o mesquinho e até rezou por ele. Falou-me que tinha esperança que Deus o ajudaria.

Trinta anos depois, Seu Eduardo Lima já morto e Helinho se tornou um conceituado profissional na arte de lidar com martelo, prego, madeira, máquina de costura e outros apetrechos. Na cidade não tem marceneiro ou estofador melhor que ele. Germano, filho do falecido sovina Eduardo, precisou que Helinho lhe fizesse uns móveis, mas estava sem dinheiro. Propôs a Helinho:

- Eu tenho umas madeiras lá em casa, que nunca usei e jamais irei usá-las, pois desconfio que elas carregam alguma maldição, porque meu pai as guardou e nunca as aproveitou. Tu vês o que valem e me faz uma proposta. Helinho quase não se aguentou, foi ver as madeiras e eram elas, aquelas que haviam lhe dado tanto trabalho. Não perdeu tempo, cobrou bem barato o serviço proposto, num prazo bem longo, desde que a madeira lhe fosse cedida para ele usar como quisesse.

Germano concordou, com a condição de que seus móveis não fossem feitos com aquelas madeiras.

Já com bastante conhecimento técnico, reconheceu-as uma a uma. Eram madeiras de lei, próprias para seu trabalho, para fazer móveis de luxo e peças torneadas. Havia ipê, peroba-amarela, maçaranduba, carvalho, cabreúva e cedro-cheiroso, que Helinho usou durante três anos, ganhando muito dinheiro. Helinho foi, e continua sendo, meu ídolo. Porque essa história, da qual ele poderia se vangloriar, sair contando a todo mundo, ele guarda quase como segredo. Eu é que estou me encarregando de divulgar...

Comece bem o seu dia, filtrando os seus melhores pensamentos!

Aroldo Arão de Medeiros

07/10/2006

AROLDO A MEDEIROS
Enviado por AROLDO A MEDEIROS em 05/01/2025
Código do texto: T8234254
Classificação de conteúdo: seguro