Cuidado com os trombadinhas em Copa!...
Aqui no Rio de Janeiro, é comum ouvir o comentário entre os amigos, que todos os meninos de rua são “trombadinhas”, e que basta um descuido para que eles nos ataquem em grupo e nos roubem alguma coisa.
Vivemos um dia-a-dia bastante tenso e, cada vez que encontramos um grupo de meninos humildes, logo imaginamos serem os famosos trombadinhas. Muitos de nós, não paramos às vezes para pensar que existe uma distinção entre a população pobre, até os miseráveis e os reais grupos de pivetes, anti-sociais e “cheiradões de cola”. Já vi muitos desses meninos (ou meninas) “dando um duro” para sobreviverem. Muitos são até arrimos de família e trabalham de sol a sol vendendo balas e doces para ajudar no sustento da família.
Não obstante, existe esse preconceito na cultura popular de que, "menor solto na rua é sinal de perigo". E muitas vezes deixamos de ajudá-los por simples preconceito e medo.
Tive uma experiência muito peculiar este final de ano, quando as calçadas de Copacabana ficam intransitáveis por causa da quantidade de transeuntes e consumidores das ilusões criadas pelo “espírito consumidor natalino” deflagrada pela mídia e lojistas.
Além dos habituais consumidores, as calçadas ficam também totalmente tomadas pelos camelôs que vendem de “um tudo” por apenas “cinco real”!
_ “Bolsas, brincos, pulseiras e vestidos da moda, relógios monblanc, rolex, calcinhas e cuecas, Dona! E só custa cinco real! CINCO REAL!! É SÓ HOJE!!”
A maioria da população conserva um olho fechado e outro aberto pra essa população de camelôs, pois sabe-se que muitos deles são apenas oportunistas na expectativa de um “desvisado” e que, dentre eles, existem os “trombadinhas” prontos a atacarem quando alguém abre ingenuamente a bolsa no meio da rua.
Eu, que não me considero uma “desavisada”, depois de mais de vinte anos morando no Rio, saio de casa nesta época do ano, com o mínimo necessário para minhas necessidades do dia e, às vezes, carrego apenas uma pequena bolsa de mão onde coloco só o celular, dinheiro necessário, um ou outro cartão para o banco e chaves de casa (fora o baton, claro! Uma mulher que se preza, não anda sem essa arma em sua bolsa! rsss...).
Fui ao banco e, depois de usar um caixa eletrônico, para fazer um pequeno saque, saí de lá muito apressada para voltar ao consultório, onde atenderia mais um cliente. Na pressa, esqueci de fechar minha bolsa e eis que uma pequena tragédia se deu: minha bolsa se abriu e todas as coisas que eu havia encaixado lá dentro, saíram rolando pela calçada no meio dos camelôs, meninos de rua, transeuntes, etc.
Amigos, o susto que tive, me levou a um desespero e eu comecei a pular e gritar (tenho essa mania quando me assusto). A sensação era a mesma de estar dando comida aos pombos pois, imediatamente, uma “galera” se jogou no chão atrás de minhas coisas que rolavam sem parar. Aflita, ainda consegui, a muito custo, pegar a tampa do meu baton e o resto...já não sabia mais onde estava. Claro que comecei a me lamentar e fazer bico de choro, quando escutei:
_ Tia, olha aqui o seu celular!
_Tia, achei seu baton, só falta a tampa!
_ Tia, olha aqui seu dinheiro, guarde logo antes que passe um ladrão!
_ Tia, essa bateria de celular é sua?
_ Tia, achei a suas chaves!
_ Tia, esse cartão do banco, tava quase na rua.
_ Falta mais alguma coisa, tia?
Olhei ao redor, sem acreditar, e comecei a agradecer quando senti falta de meu outro cartão, do banco que havia saído. Disse para eles que tava faltando um cartão, “assim e assado”. Aquelas crianças e adolescentes que ali estavam, voltaram a se mobilizar, e como numa feira, passaram a mandar mensagens pros outros camelôs que ali estavam. Por alguns instantes, todos falavam sobre meu cartão perdido e um camelô chegou a proclamar bem alto:
_”Ganha cinco real quem achar um cartão de banco!”.
Depois de alguns minutos de procura frenética, uma menina me disse: “Tia, será que tu não esqueceu o cartão lá dentro do banco?”.
Voltei ao banco para checar e eis que uma senhora segurava meu cartão em frente ao caixa que eu havia usado, perguntando: “De quem é esse cartão?”.
Recuperei meu cartão, agradeci à senhora e mais uma vez fui à rua pra agradecer àquela população. Infelizmente, ninguém mais prestou atenção em mim, pois estavam todos muitos ocupados com o trabalho. Só a adolescente do baton veio me perguntar se eu havia encontrado o cartão do banco. Perguntou-me também onde eu tinha comprado meu baton, pois ela havia gostado da cor. Resolvi dar o baton pra menina, embora ela nem soubesse distinguir a marca boa que tava levando. Disse-lhe; “É da MAC!”, ao que ela sorriu, agradeceu e disse que também gostava da "McDonalds".
Fiquei muito feliz naquele dia, não exatamente por ter resgatado coisas que eu já tinha dado como perdidas, mas porque se dissipou dentro de mim algo um tanto pesado e negativo a respeito daquela população. Como uma chama, nasceu em mim, novamente a esperança e a fé de que o ser humano, embora muitas vezes nos entristeça, não pode ser definitivamente pré-julgado e generalizado. O ser humano nos surpreende, sempre. Ele é capaz das mais belas e piores coisas que existem na vida.
Decidi continuar a ter fé, e a esperar o melhor dos outros. Decidi continuar desarmada e levar apenas meu baton em minha bolsa para me proteger. Decidi continuar apostando no lado bom do ser humano, até que ele me prove o contrario.