MEUS QUATRO VENTOS

Meus Quatro Ventos chamo Raphael, Gabriel, Cecília e Pedro. Nessa ordem, porque nasceram nessa seqüência; bem assim, um depois do outro. O que não obedece a nenhum padrão, entretanto, é o tempo em que isso se deu. Raphael chegou em minha juventude; na minha falta de experiência e durante meus anos carregados de sonhos e de esperanças. Chegou na hora certa, pois era projeto e desejo alcançado. Seu nascimento foi o coroamento de um ciclo da minha vida, como deve ser, talvez, o primeiro filho na vida de todos.Homens e mulheres. Com o nascimento de Raphael deixei de ser um; um único ser, sem meu igual; próprio. Passei a ser o primordial dele, do meu filho. Meu primeiro pedaço, minha primeira pequena parte para sempre. Que seja rei, posto que está em seu reino! Que seja o maior, o melhor, o mais tudo de todos e de todas as aspirações burguesas contemporâneas!

Com Raphael tive a percepção de sentimentos desconhecidos até então. Que só aparece com o primeiro filho; mas, que se volta a experimentar ao nascer de cada um dos outros com o mesmo jeito de coisa nova, desconhecida. O primeiro filho, e tudo o que vem dele, significa, para sempre, a vitória sobre o desconhecido. Seu lugar é único e ninguém pode ocupá-lo. Raphael é meu Primeiro Vento.

Gabriel chega 10 anos depois. Vem para por ordem na casa; para repor todas as emoções, todas as alegrias e todas as preocupações. Com ele, meu Segundo Vento, reexperimentei tudo o que achava que já sabia. Porém provei de novo tudo com outra sabedoria.

Com Gabriel fui reafirmando minhas crenças, e dele recebendo novos conhecimentos. Coisas novas, mais atualizadas, outros tempos, enfim, tudo com 10 anos há mais. Meu Segundo Vento chegou num tempo mais consolidado. Quando tudo parecia já ter se solidificado. Quase tudo já tinha sido feito e pude aproveitar com muita satisfação os bons tempos de uma carreira profissional assentada, feita, mas ainda não acabada. Um tempo em que, o que se pode por a mais acrescenta pouco; coisa que apenas hoje posso compreender.

Esses meus dois Ventos não são iguais; e só com a presença do segundo é que posso compará-los sem fazer distinções; embora cada um ocupe seu próprio lugar. Meu Segundo Vento é minha reafirmação; como a crisma é a confirmação do batismo, um não existe sem o outro. Ambos tem a mesma origem, feitos na mesma cepa e num tempo bom e de bem querença.

Meu Terceiro Venta chega bem depois, três décadas e poucos anos mais. É minha filha tão desejada; a que fiquei “chuleando” esse tempo todo. É minha princesa Cecília, minha estrela da manhã que me conduz por experimentos e sensações novas; por um outro mundo, feminino, venusino. Compreender meu Terceiro Vento é quase que um exercício de adivinhação, na maioria das vezes. Mas sua ternura, sua meiguice, seu jeito carinhoso e suas – às vezes demasiadas – preocupações comigo, me enchem de satisfação. Disfarço, mas não escondo. Não posso. Meu Terceiro Vento me dá segurança, com seus poucos 10 anos de idade, e me reafirmo diante da vida. Meu Terceiro Vento chegou feito brisa de tempo bom, depois das muitas pelejas pampianas travadas em pagos alheios. Hoje, é como estar na varanda apreciando o pôr do sol.

Meu Quarto Vento chegou como intrépido cavaleiro anunciando a redenção. É a vitória bem posta e correta. Ele é meu Benjamim; eu sou Jacó. Dizer dele é concordar com tudo. É esmilinguir-me em seu sorriso, em seu olhar maroto de cumplicidade comigo ou em seu olhar terno e amornado quando quer o que sabe que não vou dar. Meu Quarto Vento é Pedro. Para mim, que já estou na ante sala do meu último terço, é Pedro que, como uma centelha, ilumina a penumbra que antecede a escuridão.

Esses são meus Quatro Ventos. Ventos, por que passam, por que se vão; porque um dia irão por seus meios soprar outras vidas. Ventos, porque são minhas respostas; as respostas sopram no vento, sem dúvida. São quatro respostas diferentes, únicas inigualáveis. São como são as gavetas de um mesmo armário; cada uma com seu conteúdo.

Ventam como a brisa, ventam forte como o tufão; ventam gelados como o Minuano venta. São os meus quatro sopros de vidas que dei.

CESAR CABRAL
Enviado por CESAR CABRAL em 07/12/2005
Código do texto: T82220
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